Ouça os Evangelhos Sagrados
O Evangelho de
Simão Pedro.
Evangelhos do Ministério
de Jesus Cristo.
LIVRO 8
Capítulo 1
Conforme revelado em registros antigos, e narrado pela própria Maria, sua mãe, Jesus falou quando estava no berço e disse a ela: “Eu, que nasci de ti, sou Yeshua, o Poder Logos enviado pelo PAI, como te anunciou o anjo Gabriel, para a salvação do mundo.”
No reinado do imperador Cezar Augusto, ordenara que todos fossem recenseados em sua cidade natal. José partiu, então, conduzindo Maria, sua esposa.
Vieram a Jerusalém, de onde se dirigiram a Belém para inscreverem-se no local onde ele havia nascido.
Quando estavam próximos a uma caverna, Maria disse a José que sua hora havia chegado e que não poderia ir até a cidade.
Disse ela: “Entremos nesta caverna.”
O sol estava começando a se pôr. José apressou-se em procurar uma mulher que assistisse Maria no parto e encontrou uma anciã que vinha de Jerusalém.
Saudando-a, disse-lhe: “Entra na caverna onde encontrarás uma mulher em trabalho de parto.”
Após o pôr-do-sol, José chegou com a anciã à caverna e eles entraram.
A caverna irradiava uma luz que sobrepujava o brilho de inúmeras chamas, ofuscando até mesmo o sol do meio-dia.
Envolto nos braços da mãe, a criança, envolta em lençóis, mamava tranquilamente em seu seio.
Ambos ficaram surpresos com o aspecto daquela claridade e a anciã disse a Maria: “És tu a mãe desta criança?
Ao responder afirmativamente, Maria disse-lhe: “Não és semelhante às filhas de Eva.”
E Maria continuou dizendo: “Assim como entre as crianças dos homens não há nenhuma que seja semelhante ao meu filho, assim também sua mãe não tem par entre todas as mulheres.”
A anciã disse então: “Senhora e ama, vim para receber uma recompensa que perdurará para todo o sempre.”
Maria lhe disse, então: “Põe tuas mãos sobre a criança.”
Quando a anciã o fez, foi purificada. Ao sair, ela disse: “A partir deste momento, eu serei a serva desta criança e quero consagrar-me a seu serviço, por todos os dias da minha vida.”
Em seguida, quando os pastores chegaram e acenderam o fogo, entregando-se à alegria, as hostes celestiais apareceram, louvando e celebrando o Senhor, a caverna parecia-se com um templo magnífico, onde reis celestiais e terrestres celebravam a glória e os louvores de Deus devido à natividade do Senhor Jesus Cristo.
E esta anciã hebreia, vendo estes milagres resplandecentes, rendia graças a Deus, dizendo: “Eu te rendo graças, ó, Deus, Deus de Israel, porque os meus olhos viram a natividade do Salvador do mundo.”
Capítulo 2
Após o glorioso nascimento na caverna, e de José ter encontrado a anciã que testemunhou a luz e a pureza da Virgem Maria e do Menino, a criança, em um esplendor que superava a de infinitas labaredas, mamava no seio de sua mãe.
Três dias depois, Maria saiu da caverna e adentrou um estábulo, onde carinhosamente colocou a criança em uma manjedoura. Ali, um boi e um jumento, humildemente, dobraram seus joelhos e o adoraram, enquanto José e Maria permaneciam com o menino.
No sexto dia de permanência, José dirigiu-se a Belém e ali permaneceu por alguns dias.
Quando oito dias se haviam passado, eles levaram a criança para Jerusalém e, ao término da quarentena, eles o apresentaram no templo do Senhor, oferecendo por ele as oferendas prescritas pela lei de Moisés, que diz: ‘Toda criança do sexo masculino que sair de sua mãe será chamada o santo de Deus’.
Quando a Virgem Maria, transbordando de alegria, adentrou o recinto com o menino Jesus em seus braços, o ancião Simeão o contemplou, resplandecente como um facho de luz.
Uma multidão de anjos rodeava-o, louvando-o e acompanhando-o, assim como os hostes de honra seguem seu rei.
Simeão, pois, aproximando-se rapidamente de Maria e estendendo suas mãos para ela, disse ao Senhor Jesus: “Agora, Senhor, teu servo pode retirar-se em paz, segundo tua promessa, pois meus olhos viram tua misericórdia e o que preparaste para a salvação de todas as nações, luz de todos os povos e a glória de teu povo de Israel.”
Também no Templo estava a profetisa Ana, filha de Fanuel, uma mulher de oitenta e quatro anos que servia a Deus com jejuns e orações e celebrava a felicidade de Maria.
Aproximando-se do Menino, Ana O adorou, proclamando que nele residia a redenção do mundo.
Então, no oitavo dia, quando chegou o tempo da circuncisão, conforme a lei exigia para os recém-nascidos, eles o circuncidaram.
A velha anciã, então, recolheu o prepúcio e o depositou em um vaso de alabastro, que continha óleo de nardo antigo.
Tendo ela um filho que vendia perfumes, Maria deu-lhe o vaso, dizendo: “Muito cuidado para não vender este vaso cheio de perfume de nardo, mesmo que te ofereçam trezentos denários.”
E este é o vaso que Maria de Betânia, irmã de Lázaro, comprou e derramou sobre a cabeça e sobre os pés de Nosso Senhor Jesus Cristo, enxugando-os com seus cabelos.
Capítulo 3
Aconteceu que, enquanto o Senhor vinha ao mundo em Belém, cidade da Judeia, magos vieram de países do Oriente a Jerusalém, tal como havia predito Zoroastro, e traziam com eles presentes: ouro, incenso e mirra.
Adoraram a criança e renderam-lhe homenagem com seus presentes.
Então, Maria pegou uma das faixas, nas quais a criança estava envolvida, e deu-a aos magos que receberam como uma dádiva de valor inestimável.
Nesta mesma hora, apareceu-lhes um anjo sob a forma de uma estrela que já lhes havia servido de guia, e eles partiram, seguindo sua luz, até que estivessem de volta a sua pátria.
Ao retornar à sua terra, os reis e príncipes reuniram-se apressadamente com os magos. Eles queriam saber o que os magos haviam visto e feito, como foi a viagem de ida e volta, e quem os acompanhou.
Os magos mostraram-lhes a faixa que Maria lhes havia dado.
Em seguida, celebraram uma festa, acenderam o fogo segundo seus costumes, adoraram a faixa e a jogaram nas chamas. As chamas envolveram-na.
Ao apagar-se o fogo, eles retiraram o pano e viram que as chamas não haviam deixado nele nenhum vestígio.
Eles se puseram então a beijá-lo e a colocá-lo sobre suas cabeças e sobre seus olhos, dizendo: “Eis certamente a verdade! Qual é pois o preço deste objeto que o fogo não pode nem consumir, nem danificar?”
E pegando-o, depositaram-no com grande veneração entre seus tesouros.
Capítulo 4
A notícia da chegada dos magos do Oriente a Jerusalém, trazendo ricos presentes e questionando insistentemente os judeus sobre o paradeiro do rei recém-nascido, encheu o rei Herodes de temor.
Então, Herodes, o Grande, reuniu os sacerdotes e os doutores e disse-lhes: “Mostrai-me onde deve nascer o messias.”
Quando responderam ser em Belém, cidade da Judeia, Herodes pôs-se a tramar, em seu espírito, o assassinato do Senhor Jesus.
Então um anjo apareceu a José, durante o sono, e disse-lhe: “Levanta-te, pega a criança e sua mãe e vai para o Egito.”
Quando o galo cantou, José levantou-se e partiu.
Enquanto ele refletia sobre o caminho que ele devia seguir, a aurora o surpreendeu.
A correia da sela havia-se rompido ao se aproximarem de uma grande cidade, onde havia um ícone, ao qual os outros ídolos e divindades do Egito rendiam homenagem e ofereciam ofertas.
Sempre que essas divindades falavam pela boca do ídolo, os sacerdotes relatavam o que ele dizia aos habitantes do Egito e de suas margens.
Um sacerdote tinha um filho de trinta anos que estava possuído por inúmeros demônios.
Ele profetizava e anunciava muitas coisas. Quando os demônios se apossavam dele, rasgavam suas roupas e ele corria nu pela cidade, jogando pedras nas pessoas.
A hospedaria dessa cidade ficava perto deste ícone.
Quando José e Maria lá chegaram e se hospedaram, os habitantes ficaram profundamente perturbados e todos os príncipes e sacerdotes dos ídolos se reuniram ao redor desse ícone, perguntando-lhe: “De onde vem esta agitação universal e qual é a causa deste pavor que se apoderou de nosso país?”
O ídolo respondeu: “Este assombro foi provocado por uma divindade desconhecida, a verdadeira divindade, e somente Ele é digno de honras divinas por ser o verdadeiro Filho de Deus. À medida que se aproximava, a região estremeceu, emocionou-se e assombrou-se, e nós sentimos um grande temor devido ao Seu poder.”
Neste instante, esse ícone caiu e quebrou-se, tal como os outros ídolos que estavam no templo. Sua queda fez correr todos os habitantes do Egito.
Capítulo 5
O filho do sacerdote, acometido do mal que o afligia, entrou no albergue insultando José e Maria, já que os outros hóspedes haviam fugido.
Como Maria havia lavado os panos de envolver do Senhor Jesus e as estendera sobre umas madeiras, o menino possuído pegou um dos panos e colocou-a sobre sua cabeça.
Imediatamente, os demônios fugiram, saindo pela boca, tendo sido vistos sob a forma de sombras negras desformes.
O menino foi curado instantaneamente pelo poder de Jesus Cristo e se pôs a louvar o Senhor que o havia libertado e rendeu-lhe mil ações de graça.
Quando seu pai viu que ele havia recuperado a saúde, exclamou, admirado: “Meu filho, mas o que te aconteceu e como foste tu curados?”
O filho respondeu: “No momento em que me atormentavam, eu entrei na hospedaria e lá encontrei uma mulher de grande beleza, que estava com uma criança. Ela estendia sobre umas madeiras os panos de envolver que acabara de lavar. Peguei uma delas e coloquei-a sobre minha cabeça, e os demônios fugiram imediatamente e me abandonaram.”
O pai, cheio de alegria, exclamou: “Meu filho, é possível que essa criança seja realmente divina e assim que passou por nós, o ídolo partiu-se, as imagens de todos os nossos deuses caíram e uma força superior à deles destruiu-os.”
Assim se cumpriu a profecia que diz: ‘Chamei o meu filho do Egito’.
Quando José e Maria souberam que esse ídolo se havia quebrado, foram tomados de medo e de espanto e diziam: “Quando estávamos na terra de Israel, Herodes queria que Jesus morresse e, com esta intenção, ele ordenou o massacre de todas as crianças de Belém e das vizinhanças. É de se temer que os egípcios nos queimem vivos, se eles souberem que esse ícone caiu.”
Capítulo 6
Algum tempo depois, um anjo do Altíssimo apareceu a José e disse: “Retorne à terra de Judá, pois aqueles que queriam matar o menino já morreram.”
Então, José e Maria partiram para a Galileia e, ao longo do caminho, eles se aproximaram do covil dos ladrões.
Ali, os criminosos emboscavam viajantes que atravessavam o deserto, roubando suas roupas e pertences.
Em seguida, amarravam suas vítimas e as arrastavam pela vasta e árida paisagem do deserto.
Um grande barulho, como o de um rei deixando sua capital com música, um vasto exército e uma numerosa cavalaria, foi ouvido pelos ladrões.
Apavorados, então, deixaram ali todo o seu saque e apressaram-se em fugir.
Os prisioneiros, libertos, desataram as cordas que os amarravam e, pegando seus pertences, preparavam-se para partir.
Nesse momento, avistaram José e Maria se aproximando e questionaram: “Onde está o rei cujo séquito, com sua algazarra, amedrontou os ladrões a ponto de nos soltarem?”
José respondeu: “Ele nos segue.”
Capítulo 7
Chegaram em seguida a outra cidade, onde havia uma mulher endemoninhada.
Quando ela ia buscar água no poço durante a noite, o espírito rebelde e impuro apossava-se dela.
Ela não podia suportar nenhuma roupa, nem morar em uma casa.
Todas às vezes que a amarravam com cordas e correntes, ela as partia e fugia nua para locais desertos.
Ficava nas estradas e perto de sepulturas, perseguindo e apedrejando aqueles que encontrava no caminho, de forma que ela era, para seus pais, motivo de luto.
Quando Maria a viu, moveu-se de compaixão.
No mesmo instante, o demônio a abandonou e fugiu, exclamando: “Ai de mim, por tua causa, Maria, e devido ao teu filho!”
Ao ser liberta de seu tormento, a mulher olhou em volta e, envergonhada por sua nudez, buscou seus pais, evitando o contato com as outras pessoas.
Após haver vestido suas roupas, ela contou ao seu pai e aos seus o que lhe havia acontecido.
Sendo parte dos moradores mais distintos da cidade, hospedaram José e Maria em sua casa, tratando-os com grande respeito.
Capítulo 8
No dia seguinte, José e Maria continuaram sua jornada.
Ao anoitecer, chegaram a uma cidade onde celebravam um casamento.
No entanto, a noiva, por algum infortúnio ou enfermidade, estava muda.
Ao entrar na cidade, Maria, com o menino Jesus em seus braços, foi avistada pela noiva.
Esta, imediatamente, tomou a criança em seus braços, abraçou-a e a cobriu de carinho.
No mesmo instante, a fala da noiva foi restaurada e sua audição, que parecia obstruída, também se abriu.
Ela começou a expressar gratidão a Deus por sua cura.
Naquela noite, a cidade foi tomada por grande alegria, pois todos atribuíram o ocorrido a uma intervenção divina.
José e Maria permaneceram por três dias neste local, recebendo tratamento com grande deferência e esplendor.
Capítulo 9
Posteriormente, munidos de provisões para a viagem, prosseguiram para outra cidade, notável por sua prosperidade e pela boa reputação de seus habitantes, onde pernoitaram.
Nesta cidade, residia uma mulher virtuosa que, ao se banhar no rio, foi afligida por um espírito maligno que assumia a forma de serpente, envolvendo seu ventre e atormentando-a todas as noites.
Ao avistar Maria com o menino Jesus em seus braços, a mulher implorou à Virgem que a permitisse segurar e beijar a criança.
Maria consentiu e, no momento em que a mulher tocou o menino, o espírito maligno a abandonou e não mais retornou.
Todos os presentes louvaram o Senhor, e a mulher, em gratidão, os recompensou generosamente.
No dia subsequente, a referida mulher preparou água aromática para o banho do menino Jesus e, após lavá-lo, reservou essa água.
Presente no local estava uma jovem cujo corpo se encontrava afligido por lepra alba.
Ao se lavar com essa água, sua enfermidade foi imediatamente curada.
A comunidade, então, afirmou: “inegável que José, Maria e esta criança possuem natureza divina, pois não são meros mortais.”
Quando eles se preparavam para partir, essa jovem, que havia sido curada da lepra, aproximou-se deles e rogou-lhes que lhe permitissem acompanhá-los. Eles consentiram e ela foi com eles.
Capítulo 10
Dirigiram-se a uma cidade que abrigava o palácio de um poderoso príncipe. Lá chegando, foram acolhidos como hóspedes.
A jovem, ao aproximar-se da esposa do príncipe, notou-a em estado de profunda tristeza e pranto. Indagou-lhe, então, a razão de tal aflição.
A princesa respondeu: “Não vos admireis de me ver entregue à aflição. Encontro-me em meio a uma grande calamidade, que não ouso confidenciar a ninguém.”
A jovem tornou a insistir: “Se me confessares qual é o teu mal, talvez encontres remédio junto a mim.”
A esposa do príncipe dirigiu-se a ele, expressando: “Não desvendarás este segredo a quem quer que seja. Desposei um príncipe cujo domínio, assemelhando-se ao de um monarca, abrange extensos territórios.”
“Após conviver longamente com ele, não concebi herdeiro. Contudo, finalmente engravidei e dei à luz uma criança que se acometeu de lepra.”
“Ao contemplá-la, ele recusou-se a reconhecê-la como seu filho e instruiu-me a ceifar a vida da criança ou a entregá-la a uma ama para ser criada em um local tão remoto que dela não teríamos mais notícias.”
“Ademais, ordenou-me que tomasse o que me pertencia, pois não desejava mais a minha presença. É por esta razão que me entrego à aflição, lamentando a calamidade que sobre mim recaiu. Lamento por meu esposo e por meu filho.”
A jovem respondeu-lhe: “Pois não te disse que tenho para ti o remédio que te havia prometido? Eu também fui atingida pela lepra, mas fui curada por uma graça de Deus, que é Jesus, o filho de Maria.”
A mulher perguntou-lhe, então, onde está esse Deus do qual fala.
A jovem respondeu-lhe: “Ele está bem aqui, nesta casa.”
Perguntou a princesa: “Como pode ser isso, onde está ele?”
A jovem respondeu: “Aqui estão José e Maria. A criança que está com eles é Jesus e foi ele quem me curou dos meus sofrimentos.”
A princesa indagou: “E por qual meio pôde ele te curar? Não vai me relatar?”
A jovem explicou: “Recebi de sua mãe a água na qual ele havia sido lavado, espalhei-a então sobre meu corpo e fui curada da lepra.”
A esposa do príncipe ergueu-se, então, e recebeu José e Maria.
Preparou para José um magnífico banquete, para o qual muitas pessoas foram convidadas.
No dia seguinte, ela pegou água perfumada a fim de lavar o Senhor Jesus e lavou, com essa mesma água, o seu filho, que ela havia trazido consigo, e logo ele se curou da lepra.
Ela se pôs a cantar louvores a Deus e a render-lhe graças, dizendo-lhe: “Feliz da mãe que te gerou, ó, Jesus! A água com a qual o teu corpo foi lavado cura os homens, com a tua natureza.”
Ela ofereceu presentes a Maria e dela despediu-se, tratando-a com grande deferência.
Capítulo 11
Eles chegaram a outra cidade onde pernoitariam.
Dirigiram-se à residência de um homem recém-casado que, afetado por um malefício, estava impossibilitado de desfrutar da companhia de sua esposa.
Após passarem a noite na proximidade do homem, o encantamento foi desfeito.
Ao amanhecer, enquanto se preparavam para prosseguir a viagem, o esposo os impediu de partir e lhes ofereceu um farto banquete.
Capítulo 12
No dia seguinte, eles partiram e, ao se aproximarem de outra cidade, avistaram três mulheres que se afastavam de um túmulo, a derramar lágrimas.
Maria, ao vê-las, dirigiu-se à jovem que os acompanhava, solicitando: “Indaga-lhes quem são elas e qual a calamidade que as aflige.”
Elas não responderam, mas começaram a interrogá-la, questionando: “Quem sois vós e para onde vos dirigis? Pois o dia está findando e a noite se aproxima.”
A jovem respondeu: “Somos viajantes e buscamos uma hospedaria para pernoitar.”
As mulheres disseram: “Acompanhai-nos e pernoitai em nossa residência.”
Elas seguiram essas mulheres, conduzidas a uma residência recém-adquirida, ornamentada e decorada com diversos móveis.
Era inverno e a jovem, ao adentrar o aposento dessas mulheres, deparou-se com elas em pranto e lamento.
Ao lado delas, coberto por uma manta de seda, encontrava-se um mulo, e com forragem à sua frente. Elas o alimentavam e o beijavam, com grande amor e aflição.
A jovem então falou: “Ó, minha senhora, como é belo este mulo!”
Elas responderam em lágrimas: “Este mulo que estás vendo é nosso irmão, que nasceu de nossa mãe. Nosso pai, com sua morte, legou-nos vasta riqueza, e tínhamos somente este irmão, para quem buscávamos um matrimônio adequado.”
“Contudo, mulheres dominadas pelo espírito da inveja lançaram sobre ele, sem nosso conhecimento, encantamentos.”
“E em uma certa noite, pouco antes do amanhecer, estando as portas de nossa residência fechadas, encontramos nosso irmão transformado em mulo, tal qual o vês hoje, privado de sua lucidez e dignidade.”
“Rendemo-nos à tristeza, por não termos mais nosso pai para nos consolar. Consultamos todos os sábios, magos e feiticeiros do mundo, empreendemos todos os esforços, mas nenhum deles logrou êxito.”
“É por esta razão que, sempre que nosso coração se encontra prestes a sucumbir à tristeza, nos levantamos e dirigimo-nos, juntamente com nossa mãe, ao sepulcro de meu pai e, após o lamento, retornamos para cá.”
Ao ouvir tais coisas, a jovem disse: “Tende coragem e parai de chorar, pois a cura de vossos males está muito próxima, em vossa morada.”
“Eu era leprosa, mas após haver por essa mulher e a criança que está com ela e que se chama Jesus, e após haver derramado sobre meu corpo a água com a qual a sua mãe o havia lavado, eu me curei.”
“Sei que ele pode pôr um fim a vosso tormento. Levantai-vos, aproximai-vos de Maria, conduzi-o aos vossos aposentos, revelai-lhe o segredo que acabais de me contar e suplicai-lhe piedade.”
Ao ouvirem tais palavras proferidas pela jovem, elas se apressaram em ter com Maria.
Levaram o mulo até o quarto e lhe disseram, chorando: “Maria, minha Senhora, tem compaixão de tuas servas, pois nossa família está desprovida de seu chefe e não temos um pai ou um irmão que nos proteja.”
“Este mulo que aqui vês é nosso irmão. Algumas mulheres, com seus encantamentos, reduziram-no a este estado. Rogamos-te, pois, que tenhas piedade de nós.”
Maria, comovida e chorando como as mulheres, ergueu o menino Jesus e colocou-o sobre o dorso do mulo, dizendo: “Meu filho, cura este mulo através do teu grande poder e faz com que este homem recobre a razão, da qual foi privado.”
Nem bem essas palavras haviam saído dos lábios de Maria e o mulo já havia retomado a sua forma humana, mostrando-se sob os traços de um belo rapaz.
Não lhe restava nenhuma enfermidade. Ele, sua mãe e suas irmãs adoraram Maria e, erguendo o menino acima de suas cabeças, beijaram-no, dizendo: “Feliz de tua mãe, ó, Jesus, Salvador do mundo! Felizes os olhos que gozam da felicidade da tua presença.”
Capítulo 13
As duas irmãs disse à mãe: “Nosso irmão retomou a razão, graças à intervenção do Senhor Jesus e aos bons conselhos dessa jovem, que nos sugeriu recorrer à Maria e ao seu filho.”
“Agora, já que nosso irmão não está casado, pensamos que seria conveniente que ele desposasse essa moça.”
Após haver feito este pedido a Maria e haver ela consentido, fizeram para as bodas preparativos esplêndidos.
A dor transformou-se em alegria e o choro cedeu espaço a alegria.
Elas só fizeram cantar e regozijar-se, enfeitadas com magníficas vestimentas e joias preciosas.
Ao mesmo tempo, entoavam cânticos de louvor a Deus, dizendo: “Ó, Jesus, Filho de Deus, que transformaste nossa aflição em contentamento e nossas lamúrias em gritos de alegria!”
José e Maria lá permaneceram por dez dias.
Ao partirem, receberam demonstrações de veneração de parte de toda a família, que se despediu deles chorando muito, principalmente a moça que se desfazia em lágrimas.
Capítulo 14
Dirigiram-se, subsequentemente, a um deserto. Uma vez que haviam sido informados de que a área era assolada por salteadores, prepararam-se para realizar a travessia durante o período noturno.
Eis que, de repente, avistaram dois malfeitores que dormiam e, perto deles, muitos outros ladrões, seus companheiros, que também estavam entregues ao sono.
Esses dois malfeitores chamavam-se Dimas e Gestas.
O primeiro disse ao outro: “Eu te peço que deixes estes viajantes irem em paz, para que nossos companheiros não os vejam.”
Tendo Gestas recusado, Dimas disse-lhe: “Dou-te quarenta dracmas e fica com meu cinto como penhor.”
Deu-lhe o cinto e, ao mesmo tempo, pediu que não desse alarme.
Maria, vendo esse malfeitor tão disposto a servi-los, disse-lhe: “Que Deus te proteja com sua mão direita e que ele te conceda a remissão de teus pecados.”
O Senhor Jesus disse a Maria: “Daqui a trinta anos, ó, minha mãe, os judeus me crucificarão em Jerusalém e estes dois malfeitores serão postos na cruz ao meu lado. Dimas à minha direita e Gestas à minha esquerda. Neste dia, Dimas me precederá no Aeon Eterno.”
Quando ele assim falou, sua mãe respondeu-lhe: “Que Deus afaste de ti semelhante infortúnio, ó, meu filho!”
Chegaram, subsequentemente, a uma cidade repleta de ídolos.
Quando eles se aproximavam, ela foi transformada em um monte de areia.
Capítulo 15
Em sua jornada pelo deserto, sob o sol implacável, a Sagrada Família dirigiu-se a um sicômoro, hoje conhecido como Mataréia, em busca de refúgio.
O calor era intenso e as provisões de água começavam a escassear, pondo à prova a resistência de Maria e José.
Foi então que o Senhor Jesus, com o poder que lhe é inerente desde os Aeons, fez surgir uma fonte de águas límpidas e frescas naquele lugar desolado.
Maria, aliviada, aproveitou a abundância para lavar a túnica do Menino.
Aquele dia marcou o sítio com um sinal eterno, onde a própria terra testemunhou a divindade manifesta, e o bálsamo que produz esse país passou a ser reconhecido como um dom originado do suor que escorreu pelos membros do Salvador.
Prosseguindo sua jornada, a Sagrada Família, guiada pela luz divina, dirigiu-se então à antiga e majestosa cidade de Mênfis, um dos centros de poder do Egito, em busca de refúgio e provisão.
Ali, tendo visitado autoridades da cidade que representavam seu poder, eles permaneceram um tempo significativo no coração do Egito.
Durante sua estadia, o Senhor Jesus, em sua onipotência inata, realizou ali muitos milagres, manifestando sua glória e o poder do PAI de formas que transcenderam a compreensão humana.
Após passados três anos em solo egípcio, cumpre-se a profecia que diz: ‘Chamei o meu filho do Egito’, e tendo a ameaça de Herodes cessado, eles partiram e retornaram para a Judeia, conforme a vontade divina.
Quando já estavam próximos, José teve medo de entrar lá, porque acabara de saber que Herodes estava morto e que seu filho Arquelau havia lhe sucedido.
Um anjo de Deus apareceu-lhe, porém, e disse-lhe: “José, vai para a cidade de Nazaré e estabelece ali tua residência.”
Capítulo 16
Quando chegaram a Belém, havia uma proliferação de doenças graves e difíceis de serem curadas, que atacavam os olhos das crianças e lhes causavam a morte.
Uma mulher, que tinha um filho atacado por esse mal, levou-o a Maria e encontrou-a banhando o Senhor Jesus.
A mulher disse-lhe: “Maria, vê meu filho que sofre cruelmente.”
Maria, ouvindo-a, disse-lhe: “Pegue um pouco desta água com a qual eu purifiquei meu filho e espalha-a sobre o teu.”
A mulher fez como lhe havia recomendado, Maria e seu filho, depois de uma forte agitação, adormeceu. Quando acordou, estava completamente curado.
A mulher, cheia de alegria, foi até Maria, que lhe disse: “Rende graças a Deus por ele haver curado o teu filho.”
Essa mulher tinha uma vizinha cujo filho fora atingido pela mesma doença e cujos olhos estavam quase fechados. Ele gritava e chorava noite e dia.
Aquela, cujo filho havia sido curado, disse-lhe: “Por que não leva teu filho a Maria, como fiz? Quando o meu filho estava prestes a morrer, ele foi curado pela água de purificação de Jesus.”
A mulher foi pegar também daquela água e, assim que ela derramou sobre seu filho, ele foi curado.
Levou então seu filho em perfeita saúde para Maria, que lhe recomendou que rendesse graças a Deus e que não contasse a ninguém o que havia acontecido.
Capítulo 17
Havia na mesma cidade duas mulheres casadas com um mesmo homem e cada uma delas tinha um filho doente. Uma se chamava Maria e seu filho, Cleófas. Essa mulher levou seu filho a Maria, mãe de Jesus, e ofereceu uma bela toalha, dizendo-lhe: “Maria, recebe de mim essa toalha e, em troca, dá-me um dos teus linhos de envolver.”
Maria consentiu e a mãe de Cleófas confeccionou, com esse linho, uma túnica, com a qual vestiu seu filho.
Ele ficou curado e o filho de sua rival morreu no mesmo dia, o que causou profundo ressentimento entre essas duas mulheres.
Elas se encarregavam, em semanas alternadas, dos trabalhos caseiros e, um dia em que era vez de Maria, a mãe de Cléofas, ela estava ocupada aquecendo o forno para assar pão.
Precisando de farinha, deixou seu filho perto do forno.
Sua rival, vendo que a criança estava sozinha, pegou-a e jogou-a no forno em brasa e fugiu.
Maria retornou logo em seguida, mas qual não foi o seu espanto, quando ela viu seu filho no meio do forno, rindo, pois ele havia subitamente esfriado, como se jamais houvesse sido aquecido.
Ela suspeitou que sua rival o havia jogado ali e, retirando-o de lá, levou-o até a Virgem Maria e contou-lhe o que havia acontecido.
Maria disse-lhe: “Cala-te, pois receio por ti se divulgares tais coisas!”
Em seguida, a rival foi buscar água no poço e, vendo Cleófas brincando e percebendo que não havia ninguém por perto, pegou a criança e jogou-a no poço.
Alguns homens que haviam vindo para tirar água viram a criança sentada na água, sem nenhum ferimento, e por meio de cordas tiraram-na de lá.
Ficaram tão admirados com essa criança que lhe renderam as mesmas homenagens devidas a Deus.
Sua mãe, chorando, carregou-o até Maria e disse-lhe: “Minha senhora, vê o que minha rival fez ao meu filho, jogando-o no poço. Ah, ela acabará, por certo, causando-lhe a morte!”
Maria respondeu-lhe: “Deus punirá o mal que te foi feito.”
Alguns dias depois, a rival foi buscar água no poço e seus pés enroscaram-se na corda e ela caiu nele.
Ao chegarem, encontraram-na com a cabeça fraturada. Consequentemente, sua morte foi de natureza trágica.
A palavra do sábio se cumpre em si: “Cavaram um poço e jogaram a terra em cima, mas caíram no poço que eles mesmos haviam preparado.”
Capítulo 18
Outra mulher da mesma cidade tinha dois filhos, os dois doentes. Um morreu e o outro estava agonizando. Sua mãe tomou-o nos braços e levou-o até Maria.
Aos prantos, ela disse-lhe: “Minha senhora, vem em meu auxílio, com piedade de mim. Eu tinha dois filhos, acabo de perder um e vejo o outro a ponto de morrer. Imploro a misericórdia do Senhor.”
E pôs-se a gritar: “Senhor, tu és pleno em clemência e compaixão! Tu me destes dois filhos, me levaste um deles, pelo menos deixaste o outro.”
Maria, testemunha da sua extrema dor, sentiu pena e disse-lhe: “Coloca teu filho na cama de meu filho e cobre-o com suas roupas.”
Assim que a criança foi deitada ao lado de Jesus, seus olhos, antes cerrados pela morte, se abriram. Em alta voz, chamou a mãe pedindo pão, que lhe foi dado e ela comeu.
Então, sua mãe disse: “Maria, eu sei que a virtude de Deus habita em ti, a ponto de teu filho curar as crianças que o tocam.”
A criança assim curada é o mesmo Bartolomeu, que se tornaria futuramente um dos discípulos de Jesus.
Capítulo 19
Havia ainda no mesmo lugar uma leprosa que foi ter com Maria, mãe de Jesus, dizendo-lhe: “Minha senhora, tem piedade de mim.”
Maria quis saber: “Que ajuda, rogas tu? Queres esmola ou queres te curar da lepra?”
A mulher respondeu: “O que podes fazer por mim?”
Maria disse: “Espera um pouco, até que eu tenha banhado e posto meu filho na cama.”
A mulher esperou e Maria, após o haver deitado, estendeu à mulher um vaso cheio de água do banho do seu filho e disse-lhe: “Pega um pouco desta água e espalha-a sobre o teu corpo.”
Logo que a mulher acatou, ficou curada e agradeceu a Deus.
Ela partiu em seguida, após haver permanecido três dias junto de Maria, e foi para uma cidade onde morava um príncipe, que havia desposado a filha de outro príncipe.
Quando ele viu sua esposa, porém, percebeu entre seus olhos as marcas da lepra sob a forma de uma estrela e o seu casamento foi declarado nulo e não válido.
Essa mulher, vendo o desespero da princesa, perguntou-lhe a causa dessas lágrimas.
A princesa respondeu-lhe: “Não me interrogue, pois a minha lástima é tanta que eu não posso revelá-la a ninguém.”
A mulher insistia em saber, dizendo que talvez conhecesse algum remédio.
Ela viu então as marcas da lepra entre os olhos da princesa e disse a ela: “Eu também fui atingida por essa doença.”
“Fui a Belém para tratar de negócios e lá entrei numa caverna onde vi uma mulher chamada Maria.”
“Ela carregava uma criança que se chamava Jesus.”
“Vendo-me atingida pela lepra, ela teve pena de mim e me deu um pouco da água na qual havia lavado o corpo de seu filho.”
“Espalhei essa água sobre meu corpo e fui imediatamente curada.”
A princesa disse-lhe então: “Levanta-te, vem comigo e mostra-me Maria.” Ela foi, levando ricos presentes.
Quando Maria a viu, disse: “Que a misericórdia do Senhor Jesus esteja sobre ti.”
Ela lhe deu um pouco da água com a qual havia lavado seu filho.
Assim que a princesa espalhou-a sobre o próprio corpo, ela se viu curada e rendeu graças ao Senhor, assim como todos os que ali estavam.
O príncipe, ao saber que sua esposa havia sido curada, recebeu-a, celebrou um segundo casamento, e rendeu graças a Deus.
Capítulo 20
Havia, no mesmo lugar, uma jovem que demônios atormentava.
O espírito maldito aparecia sob a forma de um dragão, que queria devorá-la.
Ele já havia sugado todo o sangue, de maneira que ela se parecia com um cadáver.
Todas às vezes em que ele se jogava sobre ela, ela gritava e, juntando as mãos sobre a cabeça, dizia: “Maldição, maldição de mim, pois não existe ninguém que possa livrar-me deste horrível dragão.”
Seu pai, sua mãe e todos os que a cercavam, testemunhas de sua infelicidade, entregavam-se à aflição e derramavam lágrimas, principalmente quando a viam chorar e gritar: “Irmãos e amigos, não existirá ninguém que possa libertar-me deste monstro?”
A princesa, que havia sido curada da lepra, ouvindo a voz dessa infeliz, subiu até o telhado de seu castelo e viu-a com as mãos unidas acima da cabeça, a verter copiosas lágrimas. Todos os que a rodeavam estavam desolados.
Ela perguntou se a mãe dessa possuída vivia ainda. Quando lhe responderam que o seu pai e sua mãe estavam ambos vivos, ela disse: “Tragam sua mãe até mim.”
Quando esta chegou, ela lhe perguntou: “É tua filha que está assim possuída?
A mãe, tendo respondido que sim, chorou, mas a princesa disse-lhe: “Não revela o que vou te contar.”
“Eu já fui uma leprosa, mas Maria, a mãe de Jesus Cristo, me curou. Se queres que tua filha tenha a mesma felicidade, leva-a a Belém e implora com fé a ajuda de Maria.”
“Creio que voltarás cheia de alegria, trazendo tua filha curada.”
Imediatamente, a mãe levantou-se e partiu. Foi procurar Maria e expôs-lhe o estado de sua filha.
Maria, após tê-la ouvido, deu-lhe um pouco da água, na qual ela havia lavado seu filho Jesus, e disse-lhe para derramá-la sobre o corpo da possuída.
Em seguida, deu-lhe uma toalha do menino Jesus, acrescentando: “Pega isto e mostra-o a teu inimigo, todas às vezes em que o vir.”
Dizendo isso, despediu-as com suas bênçãos e após haver deixado Maria, elas retornaram à sua cidade.
Quando veio o tempo no qual o demônio costumava atormentá-la, ele lhe apareceu sob a forma de um grande dragão.
Ao ver a sua aparência, a jovem foi tomada pelo pavor, mas sua mãe disse-lhe: “Não temas, minha filha! Deixa que ele se aproxime mais de ti e mostre-lhe esta toalha que nos deu, Maria, e veremos o que ele poderá fazer.”
Quando o espírito maligno, que havia tomado a forma de um dragão, estava bem perto, a doente, tremendo de medo, colocou sobre sua cabeça a fralda e desdobrou-a.
De repente, dela saíram chamas que se dirigiam à cabeça e aos olhos do dragão.
Ouviu-se, então, uma vociferação gritante: “Ó Jesus, filho de Maria, que existe entre nós? Onde posso encontrar refúgio para me livrar de ti?”
O demônio fugiu apavorado, abandonando essa jovem e nunca mais apareceu.
Ela se viu curada e, grata, rendeu graças a Deus, assim como todos os que haviam presenciado esse milagre.
Capítulo 21
Havia nessa mesma cidade outra mulher cujo filho era atormentado por demônios.
Ele se chamava Judas e, sempre que o espírito maligno apoderava-se dele, ele era impulsionado a atos de violência e tentava agredir os que estavam à sua volta.
Se estivesse sozinho, voltava-se contra si, na aflição. A mãe desse infeliz, ouvindo falar de Maria e de seu filho Jesus, foi com seu filho nos braços até Maria.
Nesse meio tempo, Tiago e José haviam trazido o menino Jesus para fora da casa, para que pudesse brincar com as outras crianças.
Eles estavam sentados fora da casa e Jesus com eles. Judas aproximou-se também e sentou-se à direita de Jesus.
Quando o demônio começou a agitá-lo como sempre o fazia, o menino Judas foi impulsionado por uma força, e começou a debater as mãos no ar em direção a Jesus e acabou tocando-o do lado direito.
No momento, em que tocou Jesus, entretanto, o demônio saiu dessa criança sob a forma de um cão enraivecido, pois nenhum mal pode tocar o Logos encarnado. O Senhor Jesus disse-lhe: “Serás meu discípulo e a ti, recairá uma difícil tarefa!”
Essa criança era Judas Iscariotes, que, por desígnio divino, entregaria mais tarde Jesus para a glorificação do PAI.
O lado no qual o demônio havia tocado por meio de Judas foi o mesmo lado que os judeus, cumprindo a profecia, trespassaram mais tarde com a lança.
Capítulo 22
Quando o Senhor Jesus havia completado o seu sétimo ano, ele brincava um dia com outras crianças de sua idade.
Para divertir-se, eles faziam com barro diversas imagens de animais, de lobos, de asnos, de pássaros, cada um elogiando seu próprio trabalho e esforçando-se para ser melhor que o de seus companheiros.
Então, o Senhor Jesus disse para as crianças: “Ordenarei às figuras que fiz que andem e elas andarão.”
As crianças questionaram-no se ele era o filho do Criador.
O Senhor Jesus, então, ordenou que as imagens andassem, e elas se moviam e quando lhes mandava retornar, elas voltavam.
Ele criava figuras de pássaros que, sob seu comando, voavam.
Quando lhes oferecia alimento e água, eles comiam e bebiam.
Quando as crianças foram embora e contaram aos seus pais o que haviam visto, eles disseram: “Fugi, daqui em diante, de sua companhia, por ser um feiticeiro! Deixai de brincar com ele!”
Capítulo 23
Certo dia, quando brincava e corria com outras crianças, o Senhor Jesus passou em frente à loja de um tintureiro, que se chamava Salém.
Havia nessa loja tecidos que pertenciam a inúmeros habitantes da cidade e que Salém se preparava para tingir de várias cores.
Tendo Jesus entrado na loja, pegou todas as fazendas e jogou-as na caldeira.
Salém virou-se e, vendo todas as fazendas perdidas, pôs-se a gritar e a repreender Jesus, dizendo: “Que fizeste tu, ó, filho de Maria? Prejudicaste a mim e a meus cidadãos. Cada um pediu uma cor diferente e tu apareceste e pôs tudo a perder.”
O Senhor Jesus respondeu: “Qualquer fazenda que queiras alterar a cor, eu altero.
Ele se pôs a retirar as fazendas da caldeira e cada uma estava tingida da cor que desejava o tintureiro.
Os judeus, testemunhando esse milagre, celebraram o poder de Deus.
Capítulo 24
José ia por toda a cidade, levando com ele o Senhor Jesus.
Chamavam-no para fazer portas, arcas e catres e o Senhor Jesus estava sempre com ele.
Sempre que José precisava que seu trabalho fosse ajustado em comprimento ou largura, Jesus estendia a mão.
Assim, a madeira ficava perfeita, exatamente como José desejava, eliminando a necessidade de qualquer retoque de sua parte, visto que ele não possuía grande habilidade como carpinteiro.
Um dia, o rei de Jerusalém mandou chamá-lo e disse: “Eu quero, José, que me faças um trono segundo as dimensões do lugar onde costumo sentar-me.”
José obedeceu e, trabalhando com afinco, passou dois anos no palácio para elaborar esse trono.
Quando ele foi colocado no lugar onde deveria ficar, perceberam que de cada lado faltavam dois palmos à medida fixada.
Tomado pela ira do monarca, José, amedrontado, jejuou e não conseguiu alimentar-se.
O Senhor Jesus perguntou-lhe qual era a causa do seu receio e ele respondeu: “É que a obra na qual trabalhei durante dois anos está perdida.”
O Senhor Jesus respondeu-lhe: “Não tenhas medo e não percas a coragem. Pegue este lado do trono e eu o outro, para podermos dar-lhe a medida exata.”
José fez o que havia lhe solicitado o Senhor Jesus e cada um puxou para um lado.
O trono obedeceu e ficou exatamente com a dimensão desejada.
Os assistentes, vendo esse milagre, ficaram estupefatos e deram graças a Deus.
Esse trono foi feito com uma madeira do tempo de Salomão, filho de Davi, e que era notável por seus nós, que representavam várias formas de figuras.
Capítulo 25
Num outro dia, o Senhor Jesus foi até a praça e, vendo as crianças que se haviam reunido para brincar, juntou-se a elas.
Essas, tendo-o visto, esconderam-se e o Senhor Jesus foi até uma casa e perguntou às mulheres que estavam à porta, onde as crianças haviam ido.
Como elas responderam que não havia nenhuma delas na casa, o Senhor Jesus disse-lhes: “O que vocês estão vendo sob este arco?”
Elas responderam serem carneiros com três anos e o Senhor Jesus replicou: “Saí, carneiros, e vinde em direção ao vosso pastor.”
Imediatamente, as crianças saíram, transformadas em carneiros, e saltavam ao seu redor. As mulheres, tendo visto isso, foram tomadas de pavor e adoraram o Senhor Jesus, dizendo: “Senhor Jesus, filho de Maria, tu és verdadeiramente o bom Pastor de Israel. Tem piedade de nós, tuas servas que estão em tua presença e que não duvidam que vieste para curar, e não para prejudicar.”
O Senhor respondeu que as crianças de Israel estavam entre os povos como os etíopes. As mulheres disseram: “Senhor, conheces as coisas e nada escapa à tua infinita sabedoria. Solicitamos e esperamos a tua misericórdia. Devolve a essas crianças sua antiga forma.”
O Senhor Jesus disse, então: “Vinde, crianças, para podermos brincar.”
Imediatamente, na presença das mulheres, os carneiros retomaram a forma de crianças.
Capítulo 26
No período correspondente ao mês de Adar, Jesus reuniu as crianças e assumiu a posição de seu rei.
Elas haviam estendido suas roupas no chão para fazê-lo sentar-se sobre elas e haviam colocado sobre sua cabeça uma coroa de flores.
Como os suditos que acompanham um rei, elas se haviam enfileirado à sua direita e à sua esquerda.
Quando alguém passava por lá, as crianças obrigavam a parar e diziam-lhe: “Vem e adora o rei, para que obtenhas uma feliz viagem.”
Nisso chegaram alguns homens que carregavam uma criança em uma liteira.
Esse menino havia ido até a montanha com seus colegas para apanhar lenha e, tendo encontrado um ninho de perdiz, pôs a mão para retirar os ovos.
Uma serpente, escondida no ninho, no entanto, mordeu-o e ele chamou os companheiros para socorrê-lo.
Quando chegaram, eles o encontraram estendido no chão e quase morto.
Alguns familiares vieram e levaram-no à cidade.
Ao se aproximarem do local onde o Senhor Jesus estava sentado em seu trono, semelhante a um rei, rodeado por crianças que formavam sua corte, estas foram ao encontro dos que carregavam o moribundo e os convidaram: “Vinde e saudai o rei!”
Como eles não queriam aproximar-se devido à tristeza que sentiam, as crianças traziam-nas obrigando.
Quando estavam na frente do Senhor Jesus, ele perguntou-lhe por que estavam carregando aquela criança.
Responderam que uma serpente a havia mordido e o Senhor Jesus disse às crianças: “Vamos juntos e matemos a serpente!”
Os pais da criança que estava prestes a morrer suplicaram para que os deixassem ficar, mas elas responderam: “Não ouvistes o que o rei disse, vamos e matemos a serpente? Devemos seguir suas ordens.”
Apesar de sua oposição, eles retornaram à montanha, carregando a liteira. Quando chegaram perto do ninho, o Senhor Jesus disse às crianças: “Não é aqui que se esconde a serpente?”
Eles responderam que sim e a serpente, chamada pelo Senhor Jesus, saiu e submeteu-se a ele. O Senhor disse-lhe: “Vai e suga todo o veneno que espalhaste nas veias dessa criança.”
A serpente, arrastando-se, sugou todo o veneno que ela havia inoculado e o Senhor, em seguida, amaldiçoou-a e, fulminada, morreu logo em seguida.
Depois, o Senhor Jesus tocou a criança com sua mão e ela foi curada. Como se ela pudesse chorar, o Senhor Jesus disse-lhe: “Não chores, serás meu discípulo!”
Essa criança foi Simão de Cananeia.
Capítulo 27
Num outro dia, José havia mandado seu filho Tiago para apanhar lenha e o Senhor Jesus se havia juntado a ele para ajudá-lo.
Jesus seguiu seu irmão Tiago mas José e Maria não sabiam disso.
Quando chegaram ao lugar onde ficava a lenha, Tiago começou a apanhá-la e eis que uma víbora mordeu-o.
Ele começou a gritar e a chorar, dominado por uma dor intensa.
Ficando exausto, disse, com um grito amargo: “Ai! Infelizmente! Uma víbora amaldiçoada atingiu minha mão.”
E Jesus, que estava de pé diante dele, ao clamor amargo, correu até Tiago, e segurou sua mão.
E tudo o que ele fez foi soprar na mão de Tiago e esfriá-la, e imediatamente Tiago foi curado, e a serpente morreu.
José e Maria não sabiam o que havia sido efetuado, mas ao clamor de Tiago e ao comando de Jesus, eles correram para o jardim e encontraram a serpente já morta, e Tiago curado.
Capítulo 28
Um dia, o Senhor Jesus estava brincando com outras crianças em cima de um telhado e uma delas caiu e morreu na hora.
As outras crianças fugiram e o Senhor Jesus ficou sozinho em cima do telhado.
Então, os pais do falecido chegaram e disseram ao Senhor Jesus: “Foste tu que empurraste nosso filho do alto telhado.”
Como Jesus negou ter feito tal coisa, eles repetiram mais alto: “Nosso filho morreu e eis aqui quem o matou.”
O Senhor Jesus respondeu: “Não me acuseis de um crime do qual não tendes nenhuma prova. Perguntemos, porém, ao seu próprio filho o que aconteceu?”
O Senhor Jesus desceu, colocou-se perto da cabeça do morto.
E Jesus lhe disse: “Fui eu que te empurrei do telhado ao chão?”
Ele disse: “Você não me empurrou, mas, me ressuscitou.”
O Senhor recomendou aos presentes que prestassem atenção a essas palavras e todos eles louvaram a Deus por este milagre.
Capítulo 29
Certo dia, Maria pediu ao Senhor Jesus que tirasse água do poço.
Tendo ele concluído a tarefa e posto o cântaro cheio sobre a cabeça, este se partiu.
Tendo estendido o seu manto, o Senhor Jesus levou para sua mãe a água que havia recolhido, e ela, maravilhada com tudo o que havia visto, guardou esses fatos em seu coração.
Um dia, o Senhor Jesus estava na beira do rio com outras crianças.
Haviam cavado pequenas valas para fazer escorrer a água, formando assim pequenas represas.
O Senhor Jesus havia feito doze passarinhos de barro e os havia colocado ao redor da água, três de cada lado.
Era um dia de Sabbath e o filho de Hanon, o Judeu, veio e, vendo-os assim entretidos, disse-lhes: “Como podeis, em um dia de Sabath, fazer figuras com lama?” Ele se pôs, então, a destruir tudo.
Quando o Senhor Jesus estendeu as mãos sobre os pássaros que havia moldado, eles saíram voando e cantando.
Em seguida, o filho de Hanon, o judeu, aproximou-se da poça cavada por Jesus para destruí-la, mas a água desapareceu.
E o Senhor Jesus disse-lhe: “Vê como está água secou? Assim será a tua vida.” E a criança secou.
Certo dia, o Senhor Jesus voltava para casa com José, quando uma criança passou correndo na sua frente e deu-lhe um golpe tão violento que o Senhor Jesus quase caiu.
Ele disse a essa criança: “Não prosseguiras seu caminho!”
No mesmo instante, a criança caiu no chão e morreu.
Capítulo 30
Havia, em Jerusalém, um homem, chamado Zaqueu, que instruía os jovens. Ele disse a José: “José, por que não me envias Jesus para que ele aprenda as letras?”
Tanto José quanto Maria consentiram e, assim, levaram a criança ao mestre.
Então, o mestre escreveu o alfabeto e solicitou-lhe que pronunciasse Aleph.
Quando ele o fez, solicitou-lhe para dizer Beth.
O Senhor Jesus disse-lhe: “Dize-me primeiro o que significa Aleph e aí então pronunciarei Beth.”
O professor estava prestes a açoitá-lo, mas o Senhor Jesus começou a elucidar o significado das letras Aleph e Beth.
Ele detalhou quais letras eram retas, quais oblíquas, as de traçado duplo, as que possuíam pontos e as que não tinham, explicando que a ausência de pontos se dava pela precedência de uma letra sobre a outra.
Em suma, Jesus proferiu ensinamentos inéditos, jamais ouvidos ou lidos pelo professor.
O Senhor Jesus disse ao mestre: “Presta atenção ao que vou te dizer!”
E pôs-se a recitar clara e distintamente Aleph, Beth, Ghimel, Daleth, até o fim do alfabeto.
O mestre ficou admirado e disse: “Creio que esta criança nasceu antes de Noé.”
Virando-se para José, acrescentou: “Tu o conduziste para que eu o instruísse, mas esta criança sabe mais que todos os doutores.”
Depois disse a Maria: “Teu filho não precisa de ensinamentos.”
Em seguida, ele foi levado a um professor mais sábio que, ao vê-lo, ordenou: “Diga Aleph!”
Quando o Senhor Jesus disse Aleph, o professor solicitou-lhe que pronunciasse Beth.
O Senhor Jesus respondeu-lhe: “Dize-me o que significa a letra Aleph e então eu pronunciarei Beth.”
O mestre, irritado, levantou a mão para bater nele, mas sua mão secou instantaneamente e ele morreu.
Então, José disse a Maria: “Daqui por diante, não devemos mais deixar o menino sair de casa, pois qualquer um que se oponha a ele é fulminado pela morte.”
Capítulo 31
Quando contava doze anos, José e Maira levaram Jesus a Jerusalém por ocasião da festa.
Quando terminou a festa, eles retornaram, mas o Senhor Jesus permaneceu no templo, em meio aos doutores, aos velhos e aos mais sábios dos filhos de Israel.
Eles interrogavam sobre diferentes pontos da ciência, mas também respondia-lhes às perguntas.
Jesus perguntou-lhes: “De quem é filho, o Messias?”
Eles responderam: “Este é o filho de Davi.”
Jesus respondeu: “Como, pois, Davi, em espírito, o chama de Adonai, dizendo: ‘Disse YHWH ao meu Adonai: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés’?”
Continuou Jesus: “Pois, se Davi, o chama de Adonai, então, como ele é somente seu filho? Não vedes que o messias vem do meu PAI, acima de vosso YHWH, acima de Adonai Sabaoth e de todos os Arcontes?”
Um importante rabino interrogou-o, dizendo: “Leste os livros sagrados?”
O Senhor Jesus respondeu: “Li os livros e o que eles contêm é a doutrina dos anjos.”
Dito isso, explicou-lhes as Escrituras, a lei, os preceitos, os estatutos, os mistérios contidos nos livros das profecias que nenhuma mente humana poderia compreender.
E o principal entre os doutores disse: “Eu jamais vi ou ouvi tamanha instrução. Quem credes que seja essa criança?”
Capítulo 32
Havia lá um filósofo, astrônomo sábio, que perguntou ao Senhor Jesus se ele havia estudado a ciência dos astros.
Jesus, com sua sabedoria divina, mergulhou em uma explanação detalhada sobre a vasta dimensão do cosmos.
Ele não somente enumerou os planetas e corpos celestes, mas desvendou a essência de sua natureza, revelando as intrincadas relações de oposição que governam suas interações.
Além disso, discorreu sobre os aspectos trinário, quaternário e sêxtil, fornecendo uma compreensão profunda das influências e conexões celestes que moldam a existência.
A progressão e o movimento constante de leste a oeste de cada corpo foram meticulosamente explicados, demonstrando a ordem divina que rege o universo.
Mais do que uma mera descrição, Jesus revelou o complexo cômputo e prognóstico inerentes a esses movimentos, desvelando os padrões e ciclos desdobrados ao longo do tempo.
Esse conhecimento, nunca antes acessível à razão humana, transcendeu os limites da compreensão terrena, oferecendo uma visão sem precedentes dos mistérios celestiais e de sua intrínseca relação com o destino e os eventos na Terra.
Capítulo 33
Havia entre eles um filósofo muito sábio em medicina e ciências naturais.
Ele perguntou ao Senhor Jesus se ele havia estudado a medicina.
Jesus expôs-lhe a física, a metafísica, a hiperfísica e a hipofísica, as virtudes e anatomia do corpo, os humores e seus efeitos, o número de membros e de ossos, de secreções, de artérias e de nervos, as temperaturas, calor e seco, frio e úmido.
E quais as suas influências, quais as atuações da alma no corpo, suas sensações e suas virtudes.
A faculdade da palavra, da raiva, do desejo, sua composição e dissolução e outros conhecimentos que a inteligência e a mente humana jamais alcançaram.
Então, o filósofo ergueu-se e adorou o Senhor Jesus, dizendo: “Senhor, daqui em diante serei teu discípulo e teu servo.”
Capítulo 34
Enquanto Jesus assim falava, Maria apareceu com José, pois fazia três dias que procuravam por Jesus.
Vendo-o sentado entre os doutores, interrogando-os e respondendo-lhe alternadamente, ela lhe disse: “Meu filho, por que agiste assim conosco? Teu pai e eu te procuramos e tua ausência causou-nos muita aflição.”
Ele respondeu: “Por que me procuram? Não sabeis que convinha que eu permanecesse com essas pessoas e falar de meu PAI?”
Seus pais não entendiam as palavras que Jesus lhes dirigia.
Então, os doutores perguntaram a Maria se ele era seu filho e, tendo ela respondido que sim, eles exclamaram: “Ó, feliz Maria, que deste à luz a tal criança.”
Então, eles voltaram para Nazaré e Jesus era obediente em tudo para com José e Maria.
Sua mãe conservava todas as suas palavras em seu coração e o Senhor Jesus crescia, em tamanho, em sabedoria e em graça, diante de Deus e diante dos homens.
Ele começou desde esse dia a ocultar os seus segredos e seus mistérios, até completar trinta anos.
Capítulo 35
Após os anos ocultos de Jesus em Nazaré, onde os seus segredos e mistérios foram guardados até completar trinta anos, o PAI o revelou publicamente às margens do Jordão.
Ali, as águas sagradas testemunharam o seu batismo, e do alto do céu, as palavras do PAI ressoaram: “Este é meu filho amado no qual coloquei toda minha complacência.”
Foi nesse instante que o Espírito Santo apareceu sob a forma de uma pomba branca e repousou sobre ele.
No dia seguinte a esses eventos sublimes, o Batista, João, estava novamente em nossa companhia, a de dois de seus discípulos.
Eu, Simão Pedro, não estava ali, mas meu irmão André, sim. João, ao ver Jesus caminhar, elevou sua voz, impelido pelo Espírito, e disse: “Eis o Cordeiro de Deus!”
E André, com outro discípulo, ao ouvir João falar, sentiu seus corações impelidos por uma força irresistível e seguiram a Jesus.
Voltando-se, Jesus viu que o seguiam e perguntou: “O que procuram?”
Eles disseram: “Mestre, onde moras?”
E Jesus respondeu: “Venham e vejam”.
Eles foram e viram onde Ele morava, e permaneceram com Ele naquele dia, porque era quase a hora décima.
Um dos dois discípulos que ouviram João falar e o seguiram era André, meu próprio irmão.
Foi ele, em sua alegria e admiração, que inicialmente me encontrou, a Simão, seu irmão, e me disse, com a voz cheia de convicção: “Encontramos o Messias, que é, se interpretarmos, o Salvador”.
Então, ele me apresentou a Jesus.
E Jesus, olhando para mim, Simão, disse, com um olhar que penetrava a alma: “Tu és Simão, filho de Jonas, tu serás chamado Cefas, que significa pedra”.
Naqueles dias, o povo que estava nas trevas viu uma grande luz e, para aqueles que estavam sentados na região e sombra da morte, a luz raiou. Desde então, começou Jesus a pregar.
No dia seguinte, Jesus, andando junto ao mar da Galileia, viu a mim, Simão, chamado Pedro, e meu irmão André, que lançávamos a rede ao mar, porque éramos pescadores.
E ele disse-nos: “Sigam-me, e eu vos farei pescadores de homens”.
E nós, deixando imediatamente as nossas redes, o seguimos.
E no caminho encontramos a Filipe, e ele disse: “Siga-me”.
Ora, Filipe era de Betsaida, a mesma cidade minha e de meu irmão André.
Filipe, em sua busca pela verdade, se encontrou com Natanael e disse: “Encontramos aquele de quem escreveram Moisés na lei e os profetas: Jesus de Nazaré, filho de José.”
E Natanael, com uma ponta de ceticismo, disse: “Pode vir alguma coisa boa de Nazaré?”
Filipe, com a sabedoria da experiência, respondeu: “Vem e vê.”
Jesus viu Natanael aproximar-se dele e então disse a seu respeito, revelando seu conhecimento interior: “Eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há engano!”
Natanael, admirado, disse-lhe: “De onde me conhece?”
Jesus respondeu: “Antes que Filipe te chamasse, eu te vi, quando estavas debaixo da figueira”.
Natanael, reconhecendo o poder e a presciência do Mestre, respondeu e disse: “Mestre, tu és o Filho de Deus; tu és o Rei de Israel”.
Jesus respondeu, e disse-lhe: “Por que te disse: ‘te vi debaixo da figueira,’ crês? Verás coisas maiores do que estas.”
E continuou dizendo-lhe, para revelar os mistérios do Reino: “Em verdade vos digo, que vereis o céu aberto e os anjos do PAI subindo e descendo sobre o Filho do homem.”
Capítulo 36
O Mestre Jesus, então, nos convocou, a nós, seus doze discípulos, e deu-nos poder contra os espíritos imundos, para expulsá-los e para curar toda sorte de doenças e enfermidades.
Ele nos nomeou, para que soubéssemos a ordem da missão: O primeiro, eu, Simão, chamado Pedro, e meu irmão André; Tiago Maior, e seu irmão João, filhos de Zebedeu; Natanael, também conhecido como Bartolomeu; Judas Tomé, o Dídimo; e Levi, o publicano, conhecido como Mateus; Lebeu, cujo nome era Judas Tadeu; Simão, o cananeu; e Tiago Menor, filhos de Alfeu; e Judas Iscariotes, o predestinado para a glorificação do Logos.
Estes doze, Jesus nos enviou e nos ordenou, dizendo: “Não ireis pelo caminho dos gentios, nem entrareis em cidade de samaritanos; mas ide antes às ovelhas perdidas da casa de Israel.”
“E, indo, pregai, dizendo: ‘É chegado o Aeon Eterno.’ Curai os enfermos, purificai os leprosos, ressuscitai os mortos, expulsai os demônios.”
“De graça recebestes, de graça dai. Não leveis ouro, nem prata, nem bronze nos vossos bolsos, nem arrecade para o vosso caminho, nem duas túnicas, nem alparcas, nem cajado, porque digno é o trabalhador do seu sustento.”
“E em qualquer cidade ou vila em que vocês entrarem, perguntem quem nela é digno, e ali fiquem até que partam dali.”
“Quando entrarem numa casa, saudai-a. E, se a casa for digna, desça sobre ela a vossa paz, mas, se não for digna, que a vossa paz volte para vós.”
“Todo aquele que não vos receber, nem ouvir as vossas palavras, quando saírem daquela casa ou cidade, sacudam o pó dos vossos pés.”
“Em verdade vos digo que haverá menos rigor para a terra de Sodoma e Gomorra no dia do juízo do que para aquela cidade.”
“Eis que vos envio como ovelhas no meio de lobos, portanto, sede prudentes como as serpentes e inofensivos como as pombas.”
“Acautelai-vos, porém, dos homens, porque eles vos entregarão aos sinédrios e vos açoitarão nas suas sinagogas.”
“E sereis levados perante governadores e reis por minha causa, para testemunho contra eles e contra os gentios.”
“Mas, quando vos entregarem, não vos preocupeis em como ou no que haveis de falar; porque naquela mesma hora vos será dado o que haveis de dizer.”
“Porque não sois vós que falais, mas o Espírito de vosso PAI é quem fala em vós.”
“E o irmão entregará o irmão à morte, e o pai ao filho, e os filhos se levantarão contra seus pais, e os farão perecer.”
“Sereis odiados por todos devido ao meu nome, mas aquele que perseverar até o fim será salvo.”
“Mas, quando vos perseguirem nesta cidade, fujam para outra, porque em verdade vos digo que não acabareis de percorrer as cidades de Israel sem que venha o Filho do Homem.”
“O discípulo não está acima de seu mestre, nem o servo acima de seu senhor. Basta ao discípulo ser como seu mestre, e ao servo como seu senhor.”
“Se o mestre da casa foi chamado de Belzebu, quanto mais os de sua casa serão chamados de nomes piores?”
“Portanto, não temam, pois não há nada oculto que não seja revelado, e nada escondido que não se torne manifesto.”
“O que vos digo nas trevas, proclamai-o à luz; e o que escutais com vossos ouvidos, proclamai-o sobre os telhados.”
“E não tenham medo dos que matam o corpo, mas não podem matar a alma; temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno tanto a alma como o corpo.”
“Não se vendem dois pardais por um centavo? E nenhum deles cairá no chão sem o seu Pai. Mas até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não tenham medo, pois vocês são mais valiosos do que muitos pardais.”
“Portanto, qualquer que me confessar diante dos homens, eu também o confessarei diante de meu PAI que está no Aeon Eterno.”
“Mas qualquer que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu PAI que está no Aeon Eterno.”
“Não penseis que vim trazer paz à terra, não vim trazer paz, mas a guerra.”
“Pois vim para colocar um homem em desacordo com seu pai, e a filha contra sua mãe, e a nora contra sua sogra. E os inimigos do homem serão os de sua própria casa.”
“Aquele que não odiar seu pai e sua mãe não poderá se tornar meu discípulo.”
“E quem não odiar seus irmãos e irmãs e tomar sua cruz, como eu, não será digno de mim.”
“Quem encontrar a sua vida, irá perdê-la, quem morre por minha causa, irá achá-la.”
“Quem vos recebe, a mim me recebe e quem me recebe, recebe aquele que me enviou.”
“Aquele que recebe um profeta na qualidade de profeta, receberá a recompensa de profeta e quem recebe um justo na qualidade de justo, receberá a recompensa de justo.”
“E qualquer que der a beber a um destes pequeninos um copo de água fria somente em nome de um discípulo, em verdade vos digo que de modo algum perderá a sua recompensa.”
Capítulo 37
Após o chamado, o Mestre e nós, seus primeiros discípulos, dirigimo-nos para minha casa.
Tendo Jesus chegado à minha casa, viu minha sogra acamada e ardendo em febre.
Seu corpo tremia e a dor a afligia. Com a compaixão que lhe é própria, o Mestre aproximou-se, e eu observei enquanto Ele tomava pela mão, e no mesmo instante a febre a deixou.
Ela se levantou, revigorada, e passou a nos servir, testemunhando o poder do Salvador.
Em certa ocasião, enquanto o Mestre nos revelava os segredos do Reino, senti-me perturbado por uma aflição pessoal.
E, buscando a sua sabedoria, confessei-lhe: “Mestre, meu irmão tomou minha mulher.”
O Mestre, com a sua profunda compreensão que transcende os laços terrenos e apegos da carne, com a verdade que liberta a alma, respondeu-me: “Quem te deu poder sobre tua mulher? Se ela te deixou, é porque não te merecia.”
Suas palavras, embora duras para a minha compreensão naquele momento, revelavam a profunda verdade da liberdade do espírito e da busca pelo Aeon Eterno, onde a união é espiritual e não sujeita às paixões do mundo.
Elas nos ensinam sobre a renúncia aos bens materiais e dos laços carnais, para nos entregarmos plenamente e nos dedicarmos por completo aos ensinamentos e à vontade do PAI.
Capítulo 38
Naqueles dias, tendo o Mestre Jesus acabado de dar ordens a nós, seus doze discípulos, partiu dali para ensinar e pregar nas cidades deles.
Ora, tendo João Batista ouvido na prisão as obras do Cristo, enviou dois dos seus discípulos, a perguntar-lhe: “És tu aquele que havia de vir, ou esperamos outro?”
Jesus respondeu-lhes, com a autoridade do Logos: “Ide e anunciai novamente a João o que estais ouvindo e vendo: os cegos veem, e os coxos andam, os leprosos são purificados e os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados e todos têm a palavra proclamada a eles. Abençoado é aquele que não se ofender em mim.”
E, partindo eles, o Mestre começou a dizer à multidão a respeito de João: “O que foste ver no deserto? Um galho agitado pelo vento? Mas o que foste ver? Um homem vestido com roupas leves? Eis que os que vestem roupas macias estão nas casas dos reis. Mas o que foste ver? Um profeta? Sim, vos digo, e mais do que um profeta.”
“Pois este é aquele de quem está escrito: ‘Eis que envio o meu mensageiro diante da tua face, o qual preparará o teu caminho diante de ti’.”
“Em verdade vos digo que, entre os nascidos de mulher, não surgiu outro maior do que João Batista. Mas o menor no Aeon Eterno é maior do que ele.”
“E desde os dias de João Batista até agora se faz violência ao Aeon Eterno, e pela força se apoderam dele.”
“Pois todos os Profetas e a Lei profetizaram até João. E, se quereis dar crédito, este é o Elias que havia de vir. Quem tem ouvidos para ouvir, que ouça.”
“Mas a quem compararei esta geração?”
Continuou o Mestre. “É como crianças sentadas nos mercados e chamando seus companheiros, e dizendo: ‘Tocamos-vos flauta, e não dançastes, nós vos lamentamos, e vós não lamentastes’.”
“Porque veio João, que não comia nem bebia, e dizem: ‘Ele tem demônio’.”
“Veio o Filho do homem comendo e bebendo, e dizem: ‘Eis aqui um comilão e bebedor de vinho, amigo de publicanos e pecadores’. Mas Sophia será justificada por seus filhos’.”
Então, Jesus começou a repreender as cidades onde a maioria de suas obras poderosas foram feitas, porque elas não se arrependeram, dizendo: “Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom se tivessem operado os milagres que em vós se operaram, há muito que se teriam arrependido em pano de saco e em cinza.”
“Eu, porém, vos digo que haverá menos rigor para Tiro e Sidom no dia do juízo do que para vós.”
“E tu, Cafarnaum? Que te elevaste até ao céu, até ao inferno descerás, porque, se em Sodoma tivessem sido feitos os milagres que em ti se operaram, ela teria permanecido até hoje.”
“Eu, porém, vos digo que haverá menos rigor para a terra de Sodoma no dia do juízo do que para ti.”
Naquele tempo, Jesus disse, em uma revelação do PAI: “Graças te dou, ó, PAI, Senhor do Aeon Eterno, porque escondeste estas verdades dos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos.”
“Sim, ó, PAI, porque assim te pareceu bem. Todas as coisas me foram entregues por meu PAI, e ninguém conhece o Filho, senão o PAI, e ninguém conhece o PAI, exceto o Filho, e aquele a quem o Filho o revelar a verdade.”
“Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu domínio e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e achareis descanso para as vossas almas. Pois meu domínio é suave e meu jugo é leve.”
Capítulo 39
Certo dia, quando Jesus soube da decapitação de João, seu primo, partiu dali de barco para um lugar deserto à parte.
Mas quando o povo soube disso, eles o seguiram a pé para fora das cidades.
E Jesus saiu do barco, e viu uma grande multidão, e compadeceu-se deles, e curou os seus enfermos.
Ao cair da tarde, nós, seus discípulos, aproximamo-nos dele, dizendo: “Este é um lugar deserto e já é tarde, despede a multidão, para poderem ir às aldeias comprar mantimentos.”
Jesus, porém, lhes disse: “Não precisam ir, dai-lhes de comer.”
Respondemos-lhe nós: “Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes.”
Ele disse: “Traga-os aqui para mim.”
Então, o Mestre ordenou à multidão que se assentasse na relva, tomou os cinco pães e os dois peixes, ergueu os olhos ao céu, abençoou, partiu e deu os pães a nós, seus discípulos, e nós, os discípulos, os entregamos à multidão.
Todos comeram e se fartaram, e dos pedaços que sobraram recolhemos doze cestos cheios.
E os que comeram eram cerca de cinco mil homens, além de mulheres e crianças.
Logo ordenou Jesus a nós que entrássemos no barco e fôssemos adiante dele para o outro lado da margem, enquanto despedia a multidão.
E quando ele havia despedido das multidões, subiu a uma montanha à parte para orar. Quando a noite chegou, ele estava lá sozinho.
Mas o barco estava agora no meio do mar, agitado pelas ondas, porque o vento era contrário.
E na quarta vigília da noite, Jesus foi ter conosco, andando sobre o mar.
E nós, os discípulos, vendo-o andando sobre o mar, perturbamo-nos, dizendo: “É um espírito.”
E gritamos de medo. Mas Jesus logo nos falou, dizendo: “Tende bom ânimo, sou eu, não tenham medo.”
E eu, Simão Pedro, respondendo-lhe, disse: “Senhor, se és tu, manda-me ir ter contigo por cima das águas.”
E Jesus disse a mim: “Vem.”
Então, eu, Simão, desci do barco, andei sobre as águas, para ir ter com Jesus.
Mas, quando vi o vento forte, tive medo e comecei a afundar.
Então clamei, dizendo: “Senhor, salva-me.”
E imediatamente Jesus estendeu a mão, segurou-me e disse-me: “Homem de pouca fé, por que duvidaste?”
E quando entramos no barco, o vento cessou.
Então, os que estavam no barco o adoraram, dizendo: “Verdadeiramente, tu és o Filho do PAI.”
E, tendo nós passado, chegamos à terra de Genesaré.
Quando os homens daquele lugar tiveram conhecimento dele, eles enviaram por todo aquele país ao redor, e trouxeram a Ele todos os que estavam enfermos.
E rogaram-lhe que só tocasse na orla do seu manto, e todos os que tocavam ficavam perfeitamente curados.
Capítulo 40
Certo dia, os fariseus e saduceus, em sua cegueira e com o intuito de tentar o Mestre, aproximaram-se e solicitaram-lhe que lhes mostrasse um sinal do céu.
Ele, porém, respondeu, desvelando a verdade oculta: “Ao cair da tarde, dizeis: ‘Haverá bom tempo, porque o céu está vermelho’. E pela manhã, ‘o dia estará ruim, pois o céu está vermelho e baixo’.”
“Ó, hipócritas, vocês podem discernir a face do céu, mas não podem discernir os sinais dos tempos? Uma geração má e adúltera pede um sinal, e nenhum sinal lhe será dado, senão o sinal do profeta Jonas.”
E, após proferir tais palavras, Jesus os deixou e partiu.
Quando nós, seus discípulos, chegamos ao outro lado do mar, havíamos nos esquecido de levar o pão.
Então, Jesus nos disse: “Estejam atentos e tenham cuidado com o fermento dos fariseus e dos saduceus.”
E nós, entreolhando-nos em nossa pouca compreensão, discutíamos entre nós, pensando que Ele falava por não trazermos pão.
O mestre, percebendo nossa limitação, disse-nos: “Homens de pouca fé, por que discutem entre vós, por que não trouxestes pão?”
“Ainda não compreendestes, nem vos lembrais dos cinco pães para cinco mil, e de quantos cestos levantastes?”
“Nem os sete pães para quatro mil, e quantos cestos levantastes?”
“Como não entendeis que não vos falei a respeito do pão, para vos guardarem do fermento dos fariseus e dos saduceus? Cuidado com o ensinamento dos fariseus e dos saduceus.”
Chegando Jesus às regiões de Cesareia de Filipe, nos interrogou, dizendo: “Quem os homens dizem ser o Filho do Homem?”
Respondemos-lhe nós: “Uns dizem que és João Batista; outros, Elias e outros, Jeremias, ou algum dos profetas.”
Ele nos disse: “Mas vós, quem dizeis que eu sou?”
E eu, Simão Pedro, respondendo, disse-lhe, impelido pelo Espírito Santo: “Tu és o Cristo, o Filho do PAI Vivo.”
E Jesus, respondendo-me, disse: “Bem-aventurado és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi revelado a você por carne ou sangue, mas por meu PAI que está no Aeon Eterno.”
“E eu também te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra instruirei a minha doutrina e as portas do Hades não prevalecerão contra ela.”
“Eu te darei as chaves do conhecimento dos Aeons Eternos e tudo o que ligares na terra será ligado no Aeon Eterno.”
Então, Jesus nos ordenou, seus discípulos, que não dissemos a ninguém que ele era o Cristo.
Desde então, começou Jesus a explicar-nos que lhe convinha ir a Jerusalém, e suportar muitas coisas dos anciãos, e dos principais sacerdotes, e dos escribas, e ser morto, e ressuscitar ao terceiro dia.
Eu, Simão Pedro, o tomei e comecei a repreendê-Lo, dizendo: “Senhor, longe de ti, isso não te acontecerá!”
Ele, porém, voltando-se, disse a mim: “Afasta-te de mim, Satanás.”
Então disse Jesus a nós, seus discípulos: “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me.”
“Pois quem quiser salvar a sua vida, irá perdê-la; e quem perder a sua vida por minha causa, irá achá-la.”
“Pois, o que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma? Ou que dará o homem em troca da sua alma?”
“Porque o Filho do homem há de vir na glória de seu PAI, com os seus anjos e então ele recompensará cada homem de acordo com suas obras.”
“Em verdade vos digo que, há alguns, dos que aqui estão, que não passarão pela morte, até que vejam o Filho do homem vindo em seu reino.”
Capítulo 41
Depois de seis dias, Jesus tomou consigo a mim, Simão Pedro, e a Tiago e a João, seu irmão, e levou-nos à parte para um alto monte, em um lugar de profunda revelação.
E ali, transfigurou-se diante de nós, tornando-se branco e resplandecente como a própria luz. E eis que lhes apareceram Moisés e Elias, falando com Ele.
Então, eu disse a Jesus: “Senhor, é bom estarmos aqui, se queres, façamos aqui três tendas, uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias.”
Enquanto eu ainda falava, eis que uma nuvem luminosa nos envolveu e eis que da nuvem saiu uma voz que dizia: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo, ouçam-no.”
Ouvindo isso, nós, os discípulos, prostramo-nos com o rosto em terra e ficamos aterrorizados.
Jesus, aproximando-se, tocou-nos e disse: “Levantem e não tenham medo.”
E, levantando nossos olhos, não vimos ninguém, senão somente Jesus.
Descendo nós do monte, Jesus ordenou-nos, dizendo: “A ninguém conteis a visão, até que o Filho do homem ressuscite dentre os mortos.”
E perguntamos-lhe, dizendo: “Por que então dizem os escribas que Elias deve vir primeiro?”
E Jesus, respondendo, disse-nos: “Mas digo a vocês: Elias já veio, e eles não o reconheceram, mas fizeram com ele tudo o que quiseram. Da mesma forma, o Filho do homem será maltratado por eles.”
Então entendemos nós, os discípulos, que Ele lhes falava de João Batista.
E, quando chegamos ao meio da multidão, aproximou-se dele um homem que se ajoelhou diante de Jesus e disse: “Senhor, tenha misericórdia de meu filho, porque ele é lunático e muito atormentado, muitas vezes ele cai no fogo e muitas vezes na água. E eu o trouxe a teus discípulos, mas eles não puderam curá-lo.”
Então, Jesus, respondendo, disse: “Ó, geração incrédula e perversa, até quando estarei com vocês? Até quando terei que suportá-los? Traga a criança aqui para mim.”
E Jesus repreendeu o demônio e ele saiu da criança, que ficou curada desde aquele instante.
Então, nós, os discípulos, aproximamo-nos de Jesus à parte e dissemos: “Por que não pudemos nós expulsá-lo?”
E Jesus disse-nos: “Devido à vossa incredulidade. Porque, em verdade, vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: ‘Passa daqui para acolá’, e ele se removerá, e nada vos será impossível. No entanto, esta espécie de demônio só sai com oração e jejum.”
Estando nós na Galileia, disse-nos Jesus: “O Filho do homem será entregue nas mãos dos homens e eles o matarão, e ao terceiro dia ressuscitará.”
E nós, os discípulos, ficamos cheios de tristeza.
Tendo nós chegado a Cafarnaum, dirigiram-se a mim, Simão Pedro, os que cobravam o tributo de duas dracmas e perguntaram: “O vosso mestre não paga as duas dracmas?”
E eu respondi: “Sim.”
E quando entrei em casa, Jesus me impediu, dizendo: “O que você pensa, Simão? De quem cobram os reis da terra, impostos ou tributos? De seus próprios filhos ou de estranhos?”
Disse-lhe eu: “Dos estranhos.”
Disse-lhe Jesus: “Então, os filhos estão isentos. Mas, para não escandalizá-los, vá ao mar e jogue o anzol. Tire o primeiro peixe que você pegar, abra-lhe a boca, e você encontrará uma moeda de quatro dracmas. Pegue-a e entregue-a a eles, para pagar o meu imposto e o seu.”
Capítulo 42
Após Jesus atravessar o mar da Galileia, uma multidão o seguiu pelos milagres. Ele subiu ao monte e sentou-se com os discípulos, perto da Páscoa judaica.
Vendo a multidão, Jesus perguntou a Filipe onde comprariam pão, já sabendo o que faria.
Filipe respondeu que duzentos denários não seriam suficientes para todos.
Foi então que meu irmão André disse a Jesus: “Aqui está um rapaz com cinco pães de cevada e dois peixes, mas o que é isso para tantos?”
Jesus mandou que os cinco mil homens se sentassem na grama.
Após Jesus agradecer, distribuiu pães e peixes aos discípulos, que os serviram à multidão. Satisfeitos, ele pediu que recolhessem as sobras, resultando em doze cestos cheios.
Testemunhando o milagre, os homens reconheceram Jesus como o Cristo prometido.
Jesus subiu a uma montanha sozinho. Ao anoitecer, eu, Simão Pedro e os outros discípulos, fomos de barco para Cafarnaum.
Já escuro, Jesus não se juntara a nós, e o mar revolveu-se com um forte vento.
Remamos cerca de vinte e cinco ou trinta estádios e vimos Jesus andando sobre o mar, aproximando-se do barco.
Eu, Simão Pedro, e os outros, tememos, mas Jesus disse: “Sou eu, não tenha medo”.
Então, O recebemos no barco, e logo chegamos à terra.
A multidão, após se alimentar, procurou Jesus em Cafarnaum. Ao ser questionado sobre sua chegada, Jesus respondeu que o buscavam por comerem os pães e se satisfeito, e não pelos milagres. Ele os exortou a trabalhar pela comida que permanece para a vida eterna, dada pelo Filho do Homem, a quem o PAI selou.
Perguntaram: “O que faremos para realizar as obras do PAI?”
Jesus respondeu: “A obra do PAI é crer naquele a quem Ele enviou.”
Indagaram: “Que sinal mostras para crermos em ti? Qual é a sua obra? Nossos pais comeram maná no deserto, como está escrito: ‘Deu-lhes a comer pão do céu’.”
Jesus afirmou que o PAI, e não Moisés, provê o verdadeiro pão do céu, sendo Ele próprio, o pão da vida. Quem Nele crer e vier a Ele jamais terá fome ou sede.
Jesus veio para cumprir a vontade do Pai, sendo a salvação de todos os que Ele lhe deu. Assim, Ele garante que nenhum se perca e que todos os que creem no Filho tenham a vida eterna e sejam salvos no último dia.
Os judeus questionavam Jesus, que afirmava ser o pão descido do céu, apesar de conhecerem seus pais.
Jesus replicou que ninguém pode vir a Ele sem ser guiado pelo PAI, e que Ele ressuscitará os que creem.
Ele é o pão da vida, superior ao maná, e quem dele comer terá vida eterna, pois dará Sua carne pela vida no mundo.
Os judeus questionaram Jesus: “Como pode este dar-nos a sua carne para comer?”
Jesus respondeu: “Quem comer minha carne e beber meu sangue, terá vida eterna.”
Quem o fizesse, teria vida eterna e seria ressuscitado no último dia, pois sua carne e sangue são verdadeiras comida e bebida, garantindo permanência nele e no PAI.
Ele é o pão que desceu do céu, diferente do maná, para que quem o coma viva para sempre.
Em Cafarnaum, Jesus ensinava na sinagoga quando muitos discípulos acharam seu discurso difícil. Jesus, ciente da murmuração, perguntou se isso os escandalizava, e se veriam o Filho do Homem ascender aos Aeons Eternos.
Ele afirmou que o espírito dá vida, a carne não aproveita, e suas palavras são espírito e vida. Contudo, alguns não creram, e Jesus sabia desde o início quem não acreditava e quem o deixaria.
E Jesus disse: “Por isso vos disse que ninguém pode vir a mim, se por meu PAI lhe não for concedido”.
Desde então, muitos de seus discípulos retrocederam e não andaram mais com Ele.
Então Jesus disse a nós, os doze: “Querem vocês também se retirar?”
E eu, Simão Pedro, lhe respondi: “Senhor, para onde iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna. E nós cremos e estamos certos de que tu és o Cristo, o Filho do PAI vivo.”
Jesus respondeu-lhes: “Não vos escolhi doze, e um de vós é o escolhido?”
Ele referiu-se a Judas Iscariotes, filho de Simão: porque era ele o escolhido a quem deveria entregá-lo, sendo um dos doze.
Capítulo 43
Ora, antes da festa da páscoa, sabendo Jesus que era chegada a sua hora de passar deste mundo para os Aeons Eternos, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.
Terminada a ceia, o Mestre pediu a Judas Iscariotes, filho de Simão, que O entregasse, pois Ele sabia que o PAI lhe entregara todas as coisas e que viera do PAI e para o PAI voltaria.
Levantou-se então da ceia e tirou as suas vestes, pegou uma toalha e cingiu-se.
Depois disso, derramou água em uma bacia e começou a lavar os pés de nós, os discípulos, e a enxugá-los com a toalha com a qual estava cingido.
O Senhor aproximou-se então de mim, Simão Pedro, e o questionei dizendo: “Senhor, me lavarás os pés?”
Ele me respondeu, e disse: “O que faço, tu não sabes agora, mas tu saberás a seguir.”
Eu, persistindo em minha ignorância, lhe disse: “Nunca me lavarás os pés!”
Ele me respondeu: “Se eu não te lavar, não tens parte comigo”.
Então, eu, Simão Pedro, disse: “Senhor, então não lave somente os meus pés, mas também as minhas mãos e a minha cabeça!”
Jesus nos disse: “Aquele que é lavado não precisa senão lavar os pés, mas está limpo em tudo e vós estais limpos, mas não todos.”
Pois Ele já havia escolhido quem iria entregá-lo; portanto, disse Ele: “Nem todos estais limpos.”
Após lhes ter lavado os pés, tomado as suas vestes e posto-se de novo à mesa, o Mestre nos disse: “Sabeis o que vos fiz? Chamai-me Mestre e Senhor, e dizeis bem, pois assim eu sou. Portanto, se eu, vosso Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós também deveis lavar os pés uns dos outros.”
“Dei-vos o exemplo: façam como eu fiz. O servo não é maior que o senhor, nem o enviado é maior que quem o enviou. Felizes serão se praticarem estas coisas.”
Escolhi-vos para cumprir a Escritura: quem come meu pão me entregará. Digo-vos isso antes, para que creiais que eu sou. Quem recebe meu enviado, recebe a mim e àquele que me enviou.
Quando Jesus disse isso, ficou perturbado em espírito e testificou, e disse: “Em verdade, vos digo que um de vós me entregará”.
Então, nós, os discípulos, nos entreolhamos, duvidando de quem Ele falava.
Eu observei que João, um de nós, a quem Jesus amava, estava encostado ao Seu peito.
Eu, Simão Pedro, fiz um sinal para João, para ele perguntar quem deveria ser de quem o Mestre falava.
Então, João, reclinando-se sobre o peito de Jesus, perguntou-lhe: “Senhor, quem é?”
Jesus respondeu: “Ele é, a quem darei um pedaço de pão, após o molhar.”
E, após molhar o pão na sopa, deu a Judas Iscariotes, filho de Simão.
Então Jesus disse a Judas Iscariotes, com a Voz Divina, que sela o destino: “O que está prestes a fazer, faça-o depressa”.
Ora, nenhum de nós à mesa sabia com que intenção Ele lhe falava isso.
Uma vez que Judas era quem guardava a bolsa, alguns pensavam que Jesus o havia instruído a comprar o que nos falta para a festa ou a dar algo aos pobres.
Judas, então, tendo recebido o pão, comeu e saiu imediatamente, e era noite.
Tendo, pois, Judas saído, Jesus disse: "Agora foi glorificado o Filho do homem, e o PAI foi glorificado nele. Se o PAI for glorificado nele, o PAI também o glorificará em si, e imediatamente o glorificará. Filhinhos, ainda um pouco de tempo, estou convosco. Vós me procurareis.”
“E, como eu disse aos judeus: ‘Para onde vou, vós não podeis ir’. Então, agora digo a vocês. Um novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros, como eu vos amo, que vós também vos ameis uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”.
Eu, Simão Pedro, o questionei e disse-lhe: “Senhor, para onde vais?”
Ele respondeu-me: “Para onde vou, não podes seguir-me agora, mas tu me seguirás depois”.
Eu, Simão, disse-lhe: “Senhor, por que não posso seguir-te agora? Darei a minha vida por tua causa”.
Ele respondeu-me: “Queres dar a tua vida por mim? Em verdade, em verdade, te digo que cante o galo duas vezes até que me tenha negado três vezes”
Capítulo 44
Chegamos a um lugar chamado Getsêmani, e o Mestre, Jesus, disse a nós, seus discípulos: “Assentai-vos aqui até que eu possa orar.”
E, levando consigo a mim, Simão Pedro, e a Tiago e a João, Ele começou a ter temor e a angustiar-se.
Ele disse-nos, com uma dor que nos partia o coração: “A minha alma está profundamente triste até a morte, ficai aqui e vigiai.”
Adiantando-se um pouco de nós, ele prostrou-se em terra, e orava para que, se possível, passasse dele aquela hora.
Então, clamou, dizendo: “PAI, todas as coisas te são possíveis, passa de mim este cálice, todavia, não faça o que eu quero, mas sim o que tu queres”.
E, voltando para onde estávamos, achou-nos dormindo, o cansaço pesava sobre nossas pálpebras.
Ele disse a mim: “Simão, tu dormes! Não pudeste vigiar uma hora. Vigiai e orai, para que não entreis em tentação, o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca.”
Retirando-se outra vez, orou, dizendo as mesmas palavras.
E, retornando de sua oração, encontrou-nos outra vez dormindo, porque nossos olhos estavam pesados, e não sabíamos o que lhe responder.
Então retornou pela terceira vez, e disse-nos: “Durmam agora e descansem, é chegada a hora, eis que o Filho do Homem está sendo entregue nas mãos dos pecadores.
Levantai-vos, vamos; eis que aquele que me entregará está próximo”.
Capítulo 45
E logo, enquanto o Mestre ainda falava conosco, aproximou-se Judas, um dos doze que conosco andava, e com ele uma grande multidão, portando espadas e varas, enviada pelos principais dos sacerdotes, pelos escribas e pelos anciãos.
E o que o entregava a eles tinha-lhes dado um sinal, dizendo: “Aquele a quem eu beijar, é ele, prendei-o e levai-o com segurança.”
Assim que ele se aproximou do mestre, disse: “Rabi, Rabi!” E o beijou. E então, lançaram-lhe as mãos, em seguida, o prenderam.
Nesse instante, desembainhei a espada, ferindo o servo do sumo sacerdote, cortando-lhe uma orelha.
Mas o mestre me repreendeu e, advertindo-me, me disse: “Pedro, embainha a tua espada, porque todos os que lançarem mão da espada, da espada morrerão?”
E Jesus, respondendo, disse-lhes, àqueles que o detiveram: “Saístes com espadas e varas para me prender, como se eu fosse um malfeitor. Todos os dias eu estava convosco no templo, ensinando, e não me prendeste, mas foi para se cumprirem as Escrituras.”
E, vendo a fúria daquela multidão, e o Mestre em suas mãos, todos nós, por medo, fugimos, abandonando-o.
Lembro-me de um certo jovem que o seguia, tendo envolvido o seu corpo nu com um lençol, e os jovens o agarraram, e ele, deixando o lençol, fugiu deles nu.
Capítulo 46
E levaram o Mestre, Jesus, ao sumo sacerdote, e ali se ajuntaram todos os principais sacerdotes, os anciãos e os escribas.
Eu, Simão Pedro, o segui de longe, até no pátio dos principais sacerdotes, e estava assentado com os guardas, aquentando-me perto do fogo.
E os principais sacerdotes e todo o sinédrio buscavam testemunho contra Jesus para o matar, e não achavam.
Porque muitos testificavam falsamente contra ele, mas os testemunhos não eram concordantes.
E alguns se levantaram e testificaram falsamente contra ele, dizendo: “Nós o ouvimos dizer: ‘Derrubarei este santuário feito por mãos humanas, e em três dias construirei outro, não feito por mãos humanas’.” E nem assim era o seu testemunho.
Então, levantando-se o sumo sacerdote no meio, perguntou a Jesus, dizendo: “Tu não respondes nada! Que é que estes depõem contra ti?”
E ele permaneceu em silêncio, e não respondeu nada. O sumo sacerdote o interrogou novamente, e disse-lhe: “És tu o Cristo, o Bendito Filho do Deus?”
E disse Jesus: “Eu o sou; e vereis o Filho do Homem assentado à direita do Altíssimo, e vindo com as nuvens do céu”.
Então, o sumo sacerdote, rasgando as suas vestes, disse: “Para que precisamos ainda de testemunhas? Ouvistes a calúnia, que vos parece?” E todos o condenaram à morte.
E ali, alguns começaram a cuspir nele, e a cobrir-lhe o rosto, e a dar-lhe bofetadas, e a dizer-lhe: “Profetiza”. E os guardas davam-lhe bofetadas.
Capítulo 47
A Negação de Pedro.
Estando eu, Simão Pedro, no pátio, em baixo, veio uma das criadas do sumo sacerdote, e, vendo-me que me estava aquecendo, olhou para mim e disse: “Tu também estavas com Jesus, o nazareno?”
Mas neguei, dizendo: “Não o conheço, nem entendo o que dizes”. E saí para o alpendre, e o galo cantou.
E a criada, vendo-me outra vez, começou a dizer aos que estavam perto: “Este é um deles”.
E eu o neguei outra vez. Pouco depois, os que estavam perto disseram-me: “Verdadeiramente, tu és um deles, pois também és galileu, e a tua fala é semelhante.”
E comecei a amaldiçoar e a jurar: “Não conheci esse homem de quem falais”.
E pela segunda vez o galo cantou, e lembrei-me da palavra que Jesus me dissera: “Antes que o galo cante duas vezes, podes negar-me três vezes.” E, pensando nisso, comecei a chorar.
Capítulo 48
Jesus Perante Pilatos.
E logo pela manhã, tendo os principais sacerdotes tomado conselho com os anciãos, e os escribas, e todo o sinédrio, manifestaram Jesus, e o levaram, e o entregaram a Pilatos.
Pilatos perguntou-lhe: “És tu o rei dos judeus?”
Respondeu-lhe Ele: “És tu quem o dizes”.
E os principais sacerdotes o acusavam de muitas coisas, mas ele nada respondia.
Pilatos, porém, tornou a interrogá-lo, dizendo: “Tu não respondes nada? Eis quantas coisas testemunham contra ti”.
E Jesus não respondeu mais nada, de modo que Pilatos se admirava.
Capítulo 49
A Liberdade de Barrabás e a Condenação de Jesus.
E em cada festa, Pilatos costumava soltar-lhes um preso qualquer que solicitassem.
Havia, então, um homem chamado Barrabás, preso com os seus sediciosos, os quais num motim haviam cometido um homicídio.
E a multidão, aos gritos, começou a fazer suas perguntas, como era de costume.
Pilatos respondeu-lhes: “Quereis que vos solte o rei dos judeus?” pois sabia que, por inveja, os principais sacerdotes o haviam entregue.
E os principais sacerdotes incitaram a multidão para que, antes, lhes soltasse Barrabás.
Pilatos, porém, respondendo outra vez, perguntou-lhes: “Que quereis, pois, que eu faça àquele a quem chamais rei dos judeus?”
E clamaram outra vez: “Crucifica-o”.
Pilatos, porém, lhes perguntou: “Que mal fez ele?”
E eles clamaram ainda mais intensamente: “Crucifica-o!”
Vendo, porém, Pilatos que nada podia prevalecer, mas sim um tumulto, pegou água e lavou as mãos perante a multidão, dizendo: “Estou inocente do sangue deste justo.”
Então, respondeu todo o povo, dizendo: “Que o seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos.”
Então, soltou-lhes Barrabás e, após açoitar Jesus, entregou-o para ser crucificado.
Então, dentre os judeus, ninguém lavou as mãos, nem Herodes, nem nenhum dos seus juízes. Visto que não queriam se lavar, Pilatos se levantou.
Então, o rei Herodes ordena que o Senhor seja levado embora, dizendo-lhes: “Fazei o que vos mandei fazer a ele.”
José de Arimateia estava ali, amigo de Pilatos e do Senhor, e sabendo que iriam crucificá-lo, foi a Pilatos e pediu o corpo do Senhor para o sepultamento.
Capítulo 50
E Herodes respondeu: “Irmão Pilatos, ainda que ninguém o tivesse perguntado, nós o teríamos sepultado, pois o Shabat está próximo. Pois está escrito na Lei: O sol não deve se pôr sobre aquele que está morto.”
E ele o entregou ao povo um dia antes da festa dos pães ázimos.
Os que prenderam o Senhor começaram a empurrá-lo, correndo para ele e dizendo: “Vamos arrastar o Filho de Deus, pois temos autoridade sobre ele.”
E os soldados o levaram para a sala, o qual é o Pretório, e convocaram toda a coorte.
Ali, vestiram-no de púrpura e puseram-lhe na cabeça uma coroa de espinhos, e começaram a saudá-lo: “Salve, rei dos judeus”.
E batiam-lhe na cabeça com uma cana, e cuspiam nele, e, ajoelhando-se, o adoravam.
E, após o terem escarnecido, tiraram-lhe a púrpura, e o vestiram com as suas próprias vestes, e o levaram para fora, para o crucificarem.
E solicitaram a um certo Simão, cireneu, que passava e vinha do campo, pai de Alexandre e de Rufo, que lhe levasse a cruz, e o levaram ao lugar do Gólgota, que, significa, o lugar da Caveira.
Capítulo 51
Os soldados romanos trouxeram dois malfeitores e crucificaram o Senhor entre eles. Mas ele ficou em silêncio, como se não sentisse dor.
Já era a hora terceira, quando o crucificaram e colocaram a cruz na vertical, e escreveram uma inscrição de sua acusação: “Rei dos Judeus.”
E, depositadas as vestes diante dele, eles as dividiram e lançaram sorte sobre elas.
E colocaram ambos malfeitores, um à sua direita, e outro à sua esquerda.
E os que passavam blasfemavam dele, balançando a cabeça e dizendo: “Ah! Aquele que destrói o santuário, e em três dias o edifica! Salva-te a ti mesmo, e desce da cruz!”
E da mesma forma também os principais sacerdotes, com os escribas, desprezando entre si, diziam: “A outros salvou; a si não pode salvar. O Cristo, o rei de Israel, desça agora da cruz, para vermos e crermos”.
E um dos que com ele estavam crucificados o insultava.
Mas um dos malfeitores os afrontou: “Assim sofremos devido às maldades que fizemos; mas este, o Salvador do povo, que mal ele te fez?”
Eles ficaram com raiva dele e ordenaram que suas pernas não fossem quebradas, para que ele morresse em tormento.
E, chegando a hora sexta, houve escuridão sobre toda a Judeia, até a hora nona.
Eles ficaram perturbados e incomodados porque o sol já pode ter se posto enquanto ele ainda estava vivo.
Pois a Escritura deles diz que o sol não deve se pôr sobre alguém morto.
Um dos soldados disse: “Dê-lhe a beber fel misturado com vinagre.”
E eles fizeram a mistura e deram a ele para beber.
Assim, eles cumpriram todas as coisas e completaram todas as suas iniquidades em suas cabeças.
Muitos, porém, andavam de um lado para o outro com tochas, pensando ser noite, e eles caíram por terra.
Então, à hora nona, e o Senhor exclamou: “Meu Poder, ó Poder, me deixaste para trás!”
Quando ele disse isso, ele foi arrebatado.
Naquela hora, rasgou-se ao meio o véu do Templo de Jerusalém.
Houve um terremoto e todos ficaram apavorados.
Então, o sol brilhou e verificou-se ser dia ainda.
Estávamos também com algumas das mulheres, de longe, olhando, entre as quais Maria Madalena, Maria de Cleófas, mãe de Tiago, o Menor, e de Filipe, e Maria Salomé, as quais também o seguiam e o serviam quando ele estava na Galileia, e muitas outras que haviam subido de Betânia com ele a Jerusalém.
Capítulo 52
Então, arrancaram os pregos das mãos do Senhor e o puseram no chão.
Os judeus, porém, alegraram-se e entregaram o corpo a José de Arimateia para o sepultar, por comprovarem todas as coisas boas que o Senhor fazia.
Ele tomou o Senhor, lavou-o, envolveu-o em um lençol de linho e o levou para seu próprio túmulo, chamado Jardim de José.
Então, os judeus, os anciãos e os sacerdotes perceberam quanto mal haviam feito a si e começaram a bater no peito, dizendo: “Ai de nós pelos nossos pecados! O julgamento e o fim de Jerusalém estão próximos.”
Mas eu e meus companheiros estávamos tristes e nos escondemos, com o coração ferido.
Pois estávamos sendo procurados por eles como se fôssemos malfeitores que queriam queimar o Templo.
Enquanto estas coisas aconteciam, jejuamos e nos sentamos, lamentando e chorando, noite e dia, até o sábado.
Os escribas, fariseus e anciãos se reuniram e ouviram todo o povo murmurar e bater no peito, dizendo: “Se tais grandes sinais aconteceram quando ele morreu, vocês podem ver como ele era justo!”
Os anciãos do templo ficaram com medo e foram até Pilatos e solicitaram: “Dê-nos alguns soldados para guardar seu sepulcro por três dias, para impedir que seus discípulos venham roubar seu corpo. Caso contrário, as pessoas podem presumir que ele ressuscitou dos mortos e então nos prejudicar.”
Então Pilatos deu-lhes o centurião Petronius e soldados para guardarem o túmulo.
Os anciãos e escribas vieram com eles para o sepulcro. Todos os que estavam ali, com o centurião e os soldados, rolaram uma grande pedra e a colocaram diante da entrada do sepulcro.
Eles o selaram com sete selos, armaram ali uma tenda e montaram guarda.
Capítulo 53
De manhã cedo, quando o Shabat surgiu, uma multidão veio de Jerusalém e a área circundante para ver a cripta selada.
Mas durante a noite em que o Dia do Senhor ocorreu, enquanto os soldados permaneceram de guarda no turno de dois por dois, uma grande voz veio do céu.
Eles viram os céus se abrirem e dois anjos descerem de lá.
Eles eram muito resplandecentes e se aproximaram do sepulcro. Aquela pedra que havia sido colocada antes na entrada, rolou por si mesma e se moveu para o lado.
O sepulcro estava aberto e os dois jovens entraram.
Quando os soldados viram essas coisas, acordaram o centurião e os anciãos, pois eles também estavam de guarda.
Enquanto explicavam o que haviam visto, viram três homens emergirem do sepulcro, dois deles apoiando o outro, com uma cruz seguindo atrás deles.
As cabeças dos dois chegavam até o céu, mas a cabeça do que eles guiavam ultrapassava acima dos céus.
Eles ouviram uma voz vinda dos céus: “Você pregou aos que dormem?”
E uma resposta veio da cruz: “Sim”.
Combinaram, então, entre si, revelar o que havia acontecido a Pilatos.
Enquanto eles ainda efetuavam seus planos, os céus se abriram novamente e uma pessoa desceu e entrou no sepulcro.
Os que estavam com o centurião viram essas coisas e correram para Pilatos à noite, deixando o túmulo que estavam guardando, e explicaram tudo o que haviam visto.
Muito agitados, eles disseram: “Na verdade, ele era o Filho de Deus.”
Pilatos respondeu: “Estou limpo do sangue do Filho de Deus. Vocês decidiram fazer isso.”
Então todos se aproximaram dele para solicitar e insistir para que ordenasse ao centurião e aos soldados que nada dissessem sobre o que haviam visto.
“Pois é melhor”, disseram eles, “incorrermos em um grande pecado diante de Deus do que cair nas mãos do povo judeu e sermos apedrejados.”
E assim Pilatos ordenou ao centurião e aos soldados que não dissessem uma palavra.
Capítulo 54
Ora, Maria Madalena, discípula do Senhor, temia os judeus, pois estavam exaltados de raiva e assim ela não fez no sepulcro do Senhor as coisas que as mulheres costumavam fazer pelos entes queridos que morriam.
Mas no início da manhã do dia do Senhor, ela foi com suas amigas, Maria de Cléopas, Maria Salomé e Joana, até o sepulcro onde ele havia sido sepultado.
E elas temiam que os judeus pudessem vê-las e disseram: “Embora não pudéssemos chorar e bater em nossos peitos no dia em que ele foi crucificado, devemos fazer essas coisas agora em seu sepulcro.”
“Mas quem rolará para nós a pedra colocada diante da entrada do sepulcro, para podermos entrar, sentar ao lado dele e fazer o que devemos?”
“Pois é uma pedra grande e temos medo de que alguém nos veja. Se não podemos movê-la, devemos pelo menos jogar fora as coisas que trouxemos na entrada como um memorial para ele e choraremos e bateremos no peito até voltarmos para casa.”
Ao chegarem, encontraram o sepulcro aberto. E, quando chegaram perto, abaixaram-se para olhar para dentro e viram um jovem bonito, vestido com uma roupa muito resplandecente, sentado no meio do sepulcro.
Ele lhes disse: “Por que vocês vieram? Quem vocês estão procurando? Não é o que foi crucificado? Ele se levantou e partiu. Mas se vocês não acreditam, abaixe-se para olhar e observe o lugar onde ele foi colocado, que ele não está lá. Pois ele ressuscitou e partiu para o lugar de onde foi enviado.”
Então, as mulheres fugiram com medo.
Capítulo 55
Mas era o último dia da Festa dos Pães Ázimos, e muitos voltaram para suas casas, agora que a festa havia terminado.
Nós, os doze discípulos do Senhor, choramos e sofremos; e cada um voltou para sua casa, triste pelo que havia acontecido.
Mas eu, Simão Pedro, e meu irmão André, pegamos nossas redes e saímos para o mar. E conosco estava Levi, filho de Alfeu, a quem pelo Senhor foi chamado para ser apóstolo enquanto sentado no lugar dos cobradores de impostos na cidade de Cafarnaum.
Capítulo 56
É a ele que humildemente adoramos, pois ele nos deu a existência e a vida.
Ele nos fez sair das entranhas de nossas mães, tomou, por nós, o corpo de homem e nos redimiu, cobrindo-nos com sua misericórdia eterna e concedendo-nos a graça do seu amor e de sua bondade.
A ele, portanto, glória, poder, louvores e domínio por todos os séculos.
Que assim seja!
Amém.
FF Bruce escreve ( Jesus e as origens cristãs fora do Novo Testamento , p. 93):
A nota docética nesta narrativa aparece na declaração de que Jesus, enquanto crucificado, "permaneceu em silêncio, como se não sentisse dor", e no relato de sua morte. Evita-se cuidadosamente dizer que ele morreu, preferindo dizer que ele "foi arrebatado", como se ele — ou pelo menos sua alma ou eu espiritual — tivesse sido "assumido" diretamente da cruz para a presença de Deus. (Veremos um eco dessa ideia no Alcorão.) Então, o grito de abandono é reproduzido de uma forma que sugere que, naquele momento, seu poder divino deixou a casca corporal na qual havia se alojado temporariamente.
FF Bruce continua (op. cit.):
Além de sua tendência docética, a característica mais marcante da narrativa é a completa exoneração de Pilatos de toda a responsabilidade pela crucificação de Jesus. Pilatos está aqui a caminho do objetivo da canonização, que deveria alcançar na Igreja Copta. Ele se retira do julgamento após lavar as mãos, e Herodes Antipas o substitui, assumindo a responsabilidade que, na narrativa da paixão de Lucas, ele se recusou a aceitar. Soldados romanos não participam até serem enviados por Pilatos, a pedido das autoridades judaicas, para servir de guarda ao túmulo de Jesus. Os vilões da peça, do começo ao fim, são "os judeus" — mais particularmente, os principais sacerdotes e os escribas. São eles que condenam Jesus à morte e o maltratam; são eles que o crucificam e repartem suas vestes entre si.
Em A Morte do Messias , Raymond Brown sustenta que o Evangelho de Pedro depende dos evangelhos canônicos por meio da lembrança oral dos evangelhos pregados nas igrejas. A opinião de que o Evangelho de Pedro depende diretamente dos evangelhos canônicos também é comum.
Ron Cameron argumenta que o Evangelho de Pedro é independente dos quatro canônicos ( The Other Gospels , pp. 77-8):
A identificação das fontes do Evangelho de Pedro é uma questão de considerável debate. No entanto, a linguagem usada para retratar a paixão fornece uma pista sobre o uso das fontes, o caráter da tradição e a data de composição.
A análise revela que a narrativa da paixão do Evangelho de Pedro foi composta com base em referências às escrituras judaicas. O Evangelho de Pedro , portanto, insere-se firmemente na tradição da interpretação exegética da Bíblia. As fontes da narrativa da paixão são a tradição oral, entendida à luz das escrituras e interpretada dentro do movimento sapiencial. Isso está de acordo com o que sabemos das confissões dos primeiros crentes em Jesus: no princípio, a crença no sofrimento, morte, sepultamento e ressurreição de Jesus era simplesmente a convicção de que tudo isso aconteceu "segundo as Escrituras" (1 Coríntios 15:3-5).
Ao utilizar referências bíblicas para compor a obra, o Evangelho de Pedro não demonstra conhecimento do material especial distintivo de cada um dos quatro evangelhos agora no Novo Testamento. A técnica apologética desenvolvida, típica do Evangelho de Mateus e de Justino (um escritor eclesiástico que viveu em meados do século II), que busca demonstrar uma correspondência entre as chamadas "previsões" proféticas nas Escrituras e seus "cumprimentos" no destino de Jesus, é inexistente. O uso de fórmulas de citação para introduzir citações bíblicas também é inexistente.
Tudo isso sugere que o Evangelho de Pedro é um testemunho independente das tradições evangélicas. Sua data mais antiga possível de composição seria em meados do primeiro século, quando as narrativas da paixão começaram a ser compiladas. A data mais recente possível seria na segunda metade do segundo século, pouco antes de este evangelho ser usado pelos cristãos em Rhossus e a cópia descoberta em Oxirrinco ser feita.
É bem sabido que a narrativa da paixão que Marcos usou originalmente circulou independentemente de seu evangelho; o Evangelho de João demonstra que diferentes versões dessa narrativa inicial da paixão estavam em circulação. É possível que o Evangelho de Pedro tenha usado uma fonte semelhante àquela preservada independentemente em Marcos e João.
As histórias básicas subjacentes aos relatos da epifania e do túmulo vazio são criticamente discretas e provavelmente muito antigas. De fato, essas histórias estão intimamente relacionadas a certos relatos lendários e fragmentos apologéticos que se intrometem no evangelho do Novo Testamento (Mt 27:51-54, 62-66; 28:2-4; Mc 9:2-8 e paralelos). O Evangelho da exoneração de Pilatos por Pedro, o procurador romano que mandou matar Jesus, e a polêmica antijudaica que o acompanha são acréscimos secundários a essas narrativas primitivas, importados de uma situação em que o movimento de Jesus começava a se definir em oposição a outras comunidades judaicas.
A crítica da forma e a crítica da redação indicam que o Evangelho de Pedro dependia de diversas fontes, mas é bem possível que o documento, como o temos, seja anterior aos quatro evangelhos do Novo Testamento e possa ter servido como fonte para seus respectivos autores. O Evangelho de Pedro foi provavelmente composto na segunda metade do primeiro século, provavelmente na Síria ocidental. Como tal, é o escrito mais antigo existente produzido e circulado sob a autoridade do apóstolo Pedro. A criação de uma narrativa da paixão e ressurreição foi o produto de uma comunidade de crentes que entendiam que a atividade suprema de Deus havia ocorrido em seu próprio tempo, quando os poderes da injustiça e da morte foram conquistados pelo ato definitivo de Deus de ressuscitar os mortos. Consequentemente, o destino de Jesus é interpretado, em retrospectiva, pelas Escrituras, como a vindicação divina do justo sofredor.
JD Crossan é mais famoso por sua reconstrução de um Evangelho da Cruz preservado no Evangelho de Pedro, que serviu de base para a narrativa da paixão em todos os quatro evangelhos canônicos. Crossan expôs brevemente essa tese em " Quatro Outros Evangelhos" , bem como em seu livro "A Cruz que Falou" .
Koester criticou essa hipótese por várias razões: o Evangelho de Pedro foi preservado principalmente em um manuscrito tardio, dificultando a certeza sobre o texto; Crossan parece subestimar o papel da tradição oral e atribui todos os materiais do evangelho a fontes não canônicas anteriores; finalmente, as histórias de aparições não podem ter estado presentes na narrativa da paixão porque são independentes umas das outras nos evangelhos canônicos ( Ancient Christian Gospels , pp. 219-20). Koester chega a conclusões ligeiramente diferentes sobre a narrativa da paixão por trás de Pedro (op. cit., p. 240): "O Evangelho de Pedro , como um todo, não depende de nenhum dos evangelhos canônicos. É uma composição análoga aos Evangelhos de Marcos e João. Todos os três escritos, independentemente uns dos outros, usam uma narrativa da paixão mais antiga, baseada em uma tradição exegética que ainda estava viva quando esses evangelhos foram compostos e à qual o Evangelho de Mateus também teve acesso. Todos os cinco evangelhos em consideração, Marcos, João e Pedro, assim como Mateus e Lucas, concluíram seus evangelhos com narrativas das aparições de Jesus com base em diferentes histórias de epifania contadas em diferentes contextos. No entanto, fragmentos da história da epifania da ressurreição de Jesus do túmulo, que o Evangelho de Pedro preservou integralmente, foram empregados em diferentes contextos literários nos Evangelhos de Marcos e Mateus."
Este texto, frequentemente classificado entre os Evangelhos da Infância, narra os eventos da vida de Jesus desde o seu nascimento até o início de seu ministério público. Diferente dos evangelhos canônicos, que omitem em grande parte este período, as narrativas da infância surgiram para preencher as lacunas e satisfazer a curiosidade das comunidades cristãs primitivas sobre os anos de formação de Jesus.
Datados geralmente entre os séculos II e V d.C., esses textos, embora ricos em detalhes e milagres, são reconhecidos por estudiosos por seu caráter fantástico e lendário. Episódios que descrevem os poderes divinos de Jesus manifestados em atos que podem parecer punitivos, por exemplo, são características marcantes deste gênero. É importante notar que, ao longo das diversas traduções e cópias desses manuscritos antigos (incluindo versões em latim), refletindo as visões teológicas predominantes em suas épocas.
A atribuição a figuras apostólicas como Pedro (ou Maria, como narradora) é um recurso literário comum em obras pseudepigráficas para conferir autoridade e legitimidade à narrativa. Contudo, a erudição moderna não os considera escritos por seus supostos autores, nem inspirados divinamente nos mesmos termos dos textos canônicos.
Este texto, que compila narrativas sobre a vida do Cristo desde Sua infância até a glória de Sua ressurreição, é considerado um dos evangelhos apócrifos, tendo sido registrado em versões em grego, latim, armênio e árabe. Sua atribuição a Pedro, com a narração de Maria sobre a infância do Salvador, oferece uma perspectiva única e íntima dos mistérios divinos.
Historicamente, os evangelhos canônicos da Bíblia não detalham a infância e juventude de Jesus, o que gerou diversas especulações. Algumas tradições sugerem que o Mestre tenha se exilado ou convivido com monges do Tibete ou com os essênios, buscando instrução. Entretanto, para este cânon, a verdade se manifesta de outra forma: Jesus, em sua divindade inata e desde a mais tenra idade, era o Mestre, não o aprendiz. Ele não precisava ser instruído, mas sim Ele instruiu a todos aqueles com quem conviveu, especialmente os essênios, de onde se origina o verdadeiro conhecimento (Gnose) que deu luz aos primeiros gnósticos.
Esta narrativa, sensível e bela, revela o período da infância de Nosso Senhor Jesus Cristo, desde Seus primeiros milagres no berço e em Sua tenra idade, manifestando Sua santidade e sabedoria precoce em gestos inusitados e coerentes com Sua natureza divina. Ela preenche as lacunas deixadas pelas escrituras posteriores, apresentando um Cristo que, desde sempre, demonstrou Sua divindade e poder sobre a criação. Tais relatos foram considerados apócrifos pela Igreja e excluídos do cânon tradicional, cujos critérios de seleção permanecem objeto de debate. Contudo, em sua essência, eles complementam o conhecimento do Cristo e Sua obra.
EHRMAN, Bart; PLESE, Zlatko. The apocryphal gospels: Texts and translations. OUP USA, 2011.
newadvent.org - The Gospel According to Peter
web.archive.org - The Gospel According to Peter
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